O ‘senhor cinco por cento’ e ‘inimigo táctico’
PETRÓLEOS. A história do petróleo fica indelevelmente ligada à vida de Calouste Gulbenkian. O empresário arménio criou o acordo de exploração que ligou as principais companhias petrolíferas e foi o principal impulsionador da indústria do Golfo Pérsico. Filantropo, amante das artes e da cultura, chegou a ter uma das maiores colecionadores de artes no mundo. Obteve nacionalidade britânica, mas ‘cortou’ com os ingleses e morreu em Portugal.
A actual indústria petrolífera, tal como a conhecemos, nunca seria o que é se não fosse a intervenção do empresário de origem arménia, mas nascido perto de Istambul, na Turquia, em 1869. Calouste Gulbenkian escapou da purga turca aos arménios, que provocou a morte a mais de um milhão de pessoas, e rumou para Londres onde concluiu os estudos em engenharia, aos 28 anos, no King’s College. Aqui, ganhou uma paixão pelas artes.
Cedo percebeu a importância que o petróleo viria a ter na economia mundial. O pai já negociava querosene que importava da Rússia. No final do curso, fez uma viagem à Transcaucásia, visitando os campos petrolíferos de Baku, no Azerbaijão. Com apenas 22 anos, publicou o livro ‘A Transcaucásia – recordações de viagem’. Alguns dos capítulos foram publicados numa revista que chegou às mãos do ministro das Minas turco. Gulbenkian foi encarregado de elaborar um relatório sobre os campos de petróleo de todo o Império Otomano, em especial na Mesopotâmia.
Depois de ter elaborado trabalhos sobre as potencialidades da exploração do petróleo no Médio Oriente, organizou a Turkish Petroleum Company que depois se tornou na Iraq Petroleum Company. Criou ainda o grupo Royal Dutch, que serviu de ligação entre as indústrias norte-americanas e russas e deu o primeiro impulso à indústria na região do Golfo Pérsico.
Definitivamente instalado no centro do furacão da indústria, passou a ser conhecido como um negociador hábil e esclarecido, um perito financeiro de grande categoria que negociava contratos de exploração entre os grandes financeiros internacionais e as autoridades otomanas.
Os contactos, ao mais alto nível, permitem-lhe, depois da 1.ª Guerra Mundial, fixar residência em França. Em 1928, é chamado a participar na divisão da Turkish Petroleum Company. Mudou radicalmente de vida e começou a construir uma fortuna que, no ano da morte, em 1955, era colossal. Só em obras, estava avaliada em 15 milhões de dólares (valores da altura).
Calouste Gulbenkian criou um acordo que consistia na atribuição, a cada uma das companhias - BP, Shell Group, Companhia Francesa de Petróleos e Standard Oil/Mobil Oil - 23,75% do capital, cabendo os restantes 5% a ele próprio e a ter um estatuto diplomático. No mundo empresarial, passou a ser conhecido pelo ‘senhor 5%’. A percentagem, aparentemente pequena, foi suficiente para fazer a tal fortuna e para comprar uma vasta colecção de obras de arte, valendo-se do estatuto diplomático para movimentar livremente as peças.
No meio do sucesso, Gulbenkian entrou no turbilhão da 2ª. Guerra Mundial. A nível pessoal e político. Com nacionalidade britânica e cônsul em Paris, deslocou-se a Vichy para acompanhar o general Pétain, aliado de Hitler. A ‘traição’ não agradou a Londres que passou a considera-lo um “inimigo táctico’. Anos mais tarde, o empresário processou o Reino Unido, ganhou o caso em tribunal, mas cortou as relações com a Inglaterra. De tal forma, que recuou na intenção de oferecer a sua colecção à National Gallery que até já tinha criado uma ala com o nome do arménio.
Ainda durante a guerra, exilou-se em Portugal, habitando no melhor hotel, na altura, de Lisboa. A ideia inicial era ficar duas semanas, acabou por ficar 13 anos, morrendo em Lisboa, aos 86 anos. Só saiu uma vez, numa visita rápida a Paris, onde vivia a mulher e os dois filhos. Um deles, o próprio Gulbenkian apelidava-o de ‘play-boy’. Ofereceu as suas colecções a Portugal, ao Museu Nacional de Arte Antiga e à fundação que ele criou com fins filantrópicos, artísticos, educativos e culturais. Exigiu que a Fundação Gulbenkian só fosse inaugurada a após a sua morte. Deixou-lhe todos os bens e rendimentos que se ‘resumiam’ às obras de arte e a acções nas principais companhias petrolíferas.
A colecção de arte europeia e asiática tinha mais de seis mil obras. Na arte europeia, reuniu quadros dos mestres primitivos à pintura impressionista, como de Carpaccio, Rubens, Van Dyck, Rembrandt, Gainsborough, Romney, Lawrence, Fragonard, Renoir, Manet, Degas, Monet, entre outros. Tinha ainda um espólio de escultura do antigo Egipto, cerâmicas orientais, manuscritos, encadernações e livros antigos, artigos de vidro da Síria, tapeçarias, têxteis, peças de joalharia, moedas gregas, medalhas italianas do Renascimento.
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