‘Candongueiro’ factura 47 milhões de kwanzas por mês
TRANSPORTES. Com uma frota de 120 carros, empreendedor prevê, para os próximos anos, resultados mais avultados, estando já a investir na criação de uma oficina e de lojas de peças. Expansão do negócio para algumas províncias do sul é outra das apostas.
A ligação umbilical entre a actividade de táxi com os ‘candongueiros’, e o mercado informal, afinal, pode ser invertida, “porque há margem para formalizá-la”. Esta é a conclusão a que se chega, conhecendo a história e os projectos de Alberto Dassala.
Em 2014, como forma de inverter o quadro de pouco ou quase nenhuma facturação como camionista (era proprietário de oito camiões), decidiu pôr em prática um projecto que carregava desde 2010. Comprou 120 viaturas e colocou-as como parte do negócio da empresa Dassala Comercial, constituída em 2003.
“Comecei em 2014. Foram continhas que nos motivou a entrar no negócio, mas a grande decisão tomei em 2010. Nesta altura, os fretes dos camiões tinham baixado consideravelmente, a nossa força de trabalho era a fronteira do Cunene e do Kuando-Kubango, mas os comerciantes angolanos tinham parado de fazer compras na Namíbia e na África do Sul e os camiões ficaram parados”, conta Alberto Dassala.
A dada altura, recorreu a uma instituição financeira a partir da qual conseguiu financiamento para a aquisição da frota de viaturas da marca Toyota Hiace que hoje tem sob sua gestão.
“É esta a actividade que nos tem aguentado porque ficámos com os nossos camiões parados durante cerca de um ano e meio, desde 2015. Só há três meses é que nos surgiu um contrato com a Nocal e uma ou outra vez carregamos para as lojas Poupa Lá”, explica.
No entanto, o início da actividade foi difícil. Estava preparado para aquela que diz ser a maior dificuldade da actividade, a mentalidade dos motoristas, moldada excessivamente para o informalismo. Mas deparou-se com outra situação. O processo de compra das viaturas, marcado pela dificuldade de envio das divisas.
“Quando fomos ao Dubai para comprar os mais de 100 carros, levámos parte dos valores e lá fizemos o negócio, escolhemos os carros, mas ficaram porque tínhamos de fazer a transferência da parte em falta. Voltámos para o país com o objectivo de transferir a parte em falta, mas levámos nove meses para efectivar a transferência. Seis meses depois de termos estado lá, o fornecedor começou a pressionar, dizia que, se eu não enviasse o dinheiro com alguma urgência, perderia os 800 mil dólares que tinha deixado como sinal. Entrei em parafuso por uns bons meses”, recorda.
A situação foi determinante para que hoje tivesse uma frota constituída por duas marcas (Toyota Hiace e Nissan Urvan) quando o objectivo era ter apenas viaturas da primeira marca. “Durante o tempo de espera, o fornecedor afinal andou a vender os carros e, quando chegámos, só havia 50 dos 120 que escolhemos. Não havia mais Hiaces no mercado e psicologicamente eu não conseguia esperar mais. Encontramos o Nissan e decidi ficar com eles mesmo sabendo que, em termos de negócio, representavam desvantagem por terem motores a gasolina.”
A marca que escolheu, segundo diz, chegou a assustá-lo porque, sendo mecãnico, Dassala entende de motores, por isso não tem dúvidas de que, para a actividade de táxi, “os motores diesel são melhores, dão menos custos e facturam mais”. Os Hiaces, por exemplo, dão 18 mil kwanzas por dia e os Nissan 16.500 kwanzas. A diferença é de 1.500 kwanzas por dia num universo de 60 viaturas. “Fiz estas contas ainda lá, mas não estava em condições de esperar mais, precisava de iniciar o negócio”, recorda. Na sequência, teve de enfrentar outro constrangimento, no desalfandegamento das viaturas.
“A documentação que facilitou as transferências das divisas faziam referência a Toyota Hiaces e os carros eram Nissan. Foram cerca de 60 dias a tratar desta questão. Pagámos subestadias altas no Porto. São situações que, muitas vezes, não quero lembrar porque foram momentos muito difíceis. Tivemos o dinheiro (mais de quatro milhões de dólares) parado por cerca de um ano e tínhamos compromissos, não foi fácil.”
Nas contas de Dassala, desde o início da actividade, já investiu cerca de 5,1 milhões de dólares.
O arranque e os constrangimentos previstos
As primeiras 30 viaturas iniciaram actividade a 10 de Setembro de 2014 e os outros foram entrando à medida que foram sendo recrutados os motoristas. Em meados de 2015, entretanto, viu-se forçado a interromper a actividade para reorganizá-la, visto que a “mentalidade informal dos motoristas” estava a sobrepor-se à organização.
“Depois de acompanhar directamente o lançamento dos primeiros carros, contratei uma equipa de portugueses para dirigir o negócio, mas não conseguiu. Em menos de 60 dias, os carros estavam quase todos nos calços. Retomei a direcção do negócio, fiz um plano de reestruturação de 60 dias, mas precisei apenas de 28 e reiniciámos a actividade”, lembra.
A mentalidade dos motoristas, combinada com a dificuldade de acesso a peças e acessórios de qualidade são, no entender de Alberto Dassala, os principais desafios da actividade no país.
“Uma das grandes dificuldades são os recursos humanos e não os meios como muitos podem pensar. O nosso mercado não está preparado, em termos de raciocínio, de como se deve usar uma viatura. Tivemos grandes dificuldades, embora, desde o início, sabíamos que as teríamos. Os nossos motoristas ignoram a necessidade de cuidar dos carros apesar de serem também um meio de subsistência das famílias deles. Querem andar como bem entendem”, reclama.
Os constrangimentos só seriam ultrapassados depois de “muita conversa” e dispedimento dos motoristas que não se adaptavam aos princípios da empresa. “Depois de um ano, ganhámos calos, estamos há quase um ano e meio sossegados. Tivemos o tempo suficiente de fazer um crivo de 120 motorista e estamos sem grandes problemas, temos tido aqueles normais. Os que estão connosco até hoje são os que nos têm deixado felizes.”
Investir em toda cadeia
Para garantir a durabilidade das viaturas, Dassala investiu em uma oficina que faz a assistência das mesmas, mas num futuro breve deve começar a assistir viaturas de terceiros. A dificuldade por ora é o acesso aos acessórios de qualidade, sendo a importação o único recurso.
“Projectámos a oficina porque sabemos que o segredo de um carro é a manutenção, mas não compramos as nossas peças no país porque chegámos a conclusão que os vendidos cá não demoram. Quando fazemos, por exemplo, a aquisição de um calço de travões para um Hiace no país, faz três ou quatro dias mas, quando importamos de Portugal ou do Dubai, duram aproximadamente 30 dias e o valor é cinco vezes menor comparativamente aos preços de cá. Por isso, mesmo com as dificuldades das divisas, fazemos um esforço e importamos. Compramos os rands na fronteira para adquirirmos os acessórios em Windhoek”, explica o empreendedor.
A dificuldade de acesso a acesórios criou, entretanto, a oportunidade para um novo negócio. Dassala projecta já uma loja de peças multimarcas, com o objectivo de comercializar peças superiores às que são fornecidas por grande parte das lojas. “Em relação à oficina, temos estado a ganhar muita experiência com os nossos carros e o dia que abrirmos ao público, acreditamos que os nossos clientes também estarão satisfeitos. O mesmo digo da loja, não estaremos a falar de peças originais, como tal, mas de média/alta qualidade que são as que usamos.”
Outro segmento que surgiu na sequência do negócio é o da higienização de viaturas. A determinada altura, os motoristas foram orientados a deixar de lavar os carros em outros locais, passando a ser obrigados a depositar mil kwanzas para esta finalidade na empresa.
Facturar 47 milhões kwanzas/mês
Dos 120 carros, trabalham, em média, 90 diariamente, visto que alguns ficam condicionados à necessidade de manutenção ou por falta dos motoristas. Com esse nível de actividade, a empresa factura mais de 47 milhões de kwanzas por mês. Alberto Dassala perspectiva, entretanto, aumentar a frota para, no mínimo, trezentas viaturas. Um projecto que, segundo diz, já estaria em curso não fosse a dificuldade de divisas.
“Vamos comprar carros, porque queremos aumentar a facturação e não para renovar a frota, porque entendo que a renovação passa pelo cuidado e manutenção no momento certo e é o que nós temos estado a fazer”, explica. Também faz parte dos projectos ter entre 20 e 30 unidades em províncias como Huíla, Huambo e Benguela. Entretanto, embora conformado, Alberto Dassala lamenta o facto de os seus carros serem “vítimas da informalização”, apesar dos esforços que faz para operar formalmente.
“É outro problema que enfrentamos. Pensávamos que um carro com licença, seguro e com toda a documentação a polícia não complicaria, mas não é o que acontece. Vezes há em que o agente limita-se a pedir a documentação e vai-se embora, é complicado. Estamos habituados, mas são situações que um dia terão de terminar”, defende.
Outra situação, segundo o nosso interlocutor, prende-se com as seguradoras. “Tem de haver uma maior fiscalização no serviço das seguradoras. Não é possível que as pessoas sejam obrigadas a assegurar os carros, mas depois as seguradoras têm dificuldades em dar resposta”, critica.
A tendência crescente das empresas apostarem nas publicidades móveis foi outro tema da conversa. Alberto Dassala adiantou que apenas vê todas as suas viaturas carregadas de publicidades de diversas empresas mas nunca percebeu perfeitamente o negócio. Um cenário que alterará nos próximo dias.
“A Sonangol competia só com as empresas estrangeiras. Agora está a competir...