António Nogueira

António Nogueira

MINAS. País obteve nota positiva na última inspecção, realizada em 2009. Resultados da presente operação ainda não foram oficialmente divulgados, mas Angola foi autorizada a exportar mais diamantes, no ano passado, pela organização, comparativamente ao ano anterior.

 

DIREITO CONSTITUCIONAL. Juiz conselheiro do Tribunal Constitucional lança 2.ª edição do livro ‘Introdução ao Direito Constitucional Angolano’, no qual realça as imunidades dos magistrados judiciais, mas também as circunstâncias em que estes podem ser responsabilizados disciplinar, civil ou criminalmente. 

 

A cooperação entre Angola e a África do Sul, que envolve acordos nas áreas da defesa, ambiente, alfândegas, entre outras, deverá estar mais bem consolidada no final deste ano, altura em que se prevê a visita do Presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, a Luanda. Em entrevista ao VALOR, o embaixador fala da cooperação entre os dois Estados nesta nova fase de transição política em Angola. Na área empresarial, antecipa o interesse de companhias sul-africanas nos diamantes e Nas telecomunicações. Nesta última, a ‘gigante’ MTN, segundo confirma, está muito próxima de começar a operar em Angola.

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Qual é a avaliação que faz das relações bilaterais, neste momento de transição política em Angola?

A relação entre Angola e a África do Sul é de longa data e antecede o período que marca a Independência de Angola. O MPLA e o Congresso Nacional Africano, mas também o Chama Chama Penduza, da Tanzânia; a Frelimo, de Moçambique; a SWAPO, da Namíbia, e da Zanu-PF, do Zimbábue, todos esses movimentos de libertação trabalharam juntos até à presente data. Isso foi na era do falecido doutor Agostinho Neto e de Oliver Reginald Tambo, do ANC que tinham boas relações. Depois, Angola alcançou a Independência, em 1975, só que, infelizmente, logo depois surge a guerra civil no país. Estou a dizer isso, só para elucidar como é que as relações entre Angola e a África do Sul começaram.

Em relação ao período actual, o que destaca?

Só mais uma referência histórica. O Governo angolano, na liderança do doutor Agostinho Neto, foi o primeiro país que albergou aqui [em Angola] a ala militar do ANC, que era chamada ‘Umkhonto we Sizwe’. Os primeiros elementos do ANC que chegaram a Angola vieram no tempo em que o Agostinho Neto assumiu a pasta de Presidente. Isso espelha bem o envolvimento e a relação entre os dois países, que sempre foram muito fortes. Isso, fora do quadro de relações de partido para partido. Sabemos qual foi o papel desempenhado pelo Governo angolano para a libertação da Namíbia. E, após isso, para a libertação da África do Sul. Lembro-me da guerra do Kuito Kuanavale na qual o regime do apartheid foi humilhado. Após isso, A África do Sul tornou-se também um país independente. Depois desse processo, que se deu em 1994, as relações bilaterais foram formalizadas através de um acordo de cooperação mista, assinado em Novembro de 2000.

E o que esse acordo previa de concreto?

Nessa altura, foram rubricados cerca de 33 memorandos entre os dois países. Foram rubricados memorandos na área da agricultura, energia, saúde, arte e cultura, defesa e cooperação económica. Todos estes acordos foram assinados a partir daquela data e prevaleceram até 2017.

Voltando à pergunta inicial. Hoje que Angola vive uma nova liderança política, que avaliação faz da relação bilateral com a África do Sul?

A mudança actual na liderança política em Angola tem também o seu impacto no sentido de facilitar as relações entre os dois países. É só lembrar que a primeira visita do actual chefe de Estado angolano foi para a África do Sul, em Novembro do ano passado. E, antes do final deste ano, o presidente Cyril Ramaphosa fará a reciprocidade da visita do camarada João Lourenço.

Para além dos acordos que já referiu, Angola e a África do Sul rubricaram recentemente novos protocolos. Como está a implementação desse novo processo?

O mais importante foram os acordos bilaterais assinados entre os dois presidentes, o que significa que a comissão mista foi elevada para o nível mais alto. Ou seja, saiu dos ministros das Relações Exteriores para os presidentes dos dois países. Ambos concordaram em reunir anualmente com o objectivo de fazer a avaliação dos acordos que foram assinados para verificar se estão a ser realmente implementados. Foram assinados acordos na área das alfândegas, ambiente, segurança e supressão de vistos.

Em relação ao acordo de supressão de vistos, houve impacto imediato?

Sim! Os números dobraram. Era muito difícil para o sul-africano visitar Angola. E o processo era moroso e longo. Agora é mais fácil. É só comprar o bilhete de passagem, levar todos os documentos necessários e visitar o país. Neste momento, estamos a falar do grande fluxo que há entre Luanda e a Cidade do Cabo. Porque a Cidade do Cabo é uma zona turística por natureza. Para negócios, o fluxo é entre Luanda e Joanesburgo. Outro pormenor importante é que, nesse momento, há muitos angolanos a viajar para a África do Sul em tratamento médico. Outros são os estudantes. Estes cidadãos estão agora a solicitar os serviços da embaixada (da África do Sul) no sentido de adquirirem os vistos para lhes ser permitida a sua entrada.

O regime de supressão de vistos é também válido, por exemplo, para os cidadãos angolanos que vão a tratamento médico e estudantes?

O processo é o seguinte: cada cidadão tem o direito de entrar na África do Sul durante 90 dias por ano sem solicitar o visto. Mas, visto que, no caso de tratamento médico e de estudo, as pessoas poderão necessitar de permanecer mais tempo para além dos 90 dias, então, nesses casos, tem de solicitar o visto.

Na área da Defesa, que acordos em concreto foram rubricados?

Este é um acordo assinado entre os dois chefes de Estado e o objectivo é que as operações entre os dois países, nesse ramo, sejam facilitadas. A partir daí, entra a parte técnica que deverá discutir em que áreas ou como esse processo deverá ser proocessado. Só no final desse processo é que vamos saber qual será realmente o efeito desses acordos, entre os dois países. É preciso lembrar que, para todos acordos existe uma linha padrão. Por exemplo, antes de se fazer a supressão dos vistos, tivemos de fazer um trabalho primário para saber que riscos poderia haver nesse processo. Este mesmo processo é também aplicável na área das alfândegas.

Mudando de assunto, em que pé está a situação da De Beers em Angola, sendo que a empresa diminuiu a sua operação no país. Há novas perspectivas?

É uma pergunta um pouco técnica. Mas devo dizer que antes havia muitos desafios para os sul-africanos em Angola, no ramo dos negócios. Mas o novo Governo angolano está a aliviar este quadro. No passado, em Angola, para se fazer negócio, como estrangeiro, tinha de se ter um parceiro angolano. Isto também é algo que foi abolido e dá vantagem. Significa que os empresários sul-africanos têm condições e podem vir montar também o seu negócio em Angola, desde que respeitem e obedeçam as leis em vigor. Recentemente, recebemos um dos homens fortes de negócios sul-africano, o senhor Tokyo Sexwale, que assinou alguns contratos na exploração diamantífera, através de uma sociedade mista, formada entre ele e um cidadão angolano. E é uma empresa nova formada no início deste ano, chamada Angossa. Ou seja, é um grupo angolano-sul-africano. Isso significa que as coisas estão a correr bem entre os dois países, devido às relações fortes que existem desde há longa data.

Mas a De Beers deverá ou não reforçar a sua posição em Angola?

Neste momento, infelizmente não posso entrar em detalhes, porque, como a De Beers se tinha retirado do mercado angolano e está, neste momento, a voltar, significa que está a finalizar as negociações com o Governo angolano. E só a partir daí é que teremos mais detalhes acerca das suas operações em Angola.

Sabe-se que há também da parte dos empresários sul-africanos o interesse em investir na área das telecomunicações, em Angola. Que informações pode avançar em relação a este assunto?

O Governo angolano emitiu a quarta licença para as comunicações. A empresa MTN, que está em quase em todos os países africanos, está a finalizar as negociações para começar a operar em Angola. Há duas empresas que estão a competir, a MTN, da África do Sul, e uma empresa local, de origem angolana. Penso que isso vai acontecer em finais de Outubro.

A MTN, caso vença esse concurso, vai operar sozinha ou em parceria com alguma empresa local?

A MTN, se ganha o concurso, deverá operar com outras empresas locais. É claro que a MTN não vai colocar aqui as suas infra-estruturas. Deverá colaborar com as empresas locais como é o caso da Unitel e outras. Até porque essas empresas locais já têm as suas antenas e as suas estruturas. Esta é a lógica que tenho, olhando para a situação.

Acredita que a MTN vai ganhar o concurso?

É difícil dizer que a empresa vai ganhar o concurso. Vai depender. Conforme disse, este é um concurso entre duas empresas e quem ganhar vai receber a licença. Mas posso realçar que a MTN é uma empresa forte. Acredito que tem a possibilidade de ganhar. Repare que é uma empresa que já opera em vários países africanos e também na Ásia. Tem grande capacidade de ganhar esse concurso.

De uma forma geral, como avalia actualmente a presença de empresas sul-africanas em Angola?

Este processo está no bom caminho. E agora tudo está a acontecer muito rápido. Na última edição da Filda, tivemos a presença de 18 empresas sul-africanas. Isto é um ponto que realça que os sul-africanos estão realmente a investir em Angola. O pavilhão sul-africano foi considerado o melhor, na Filda passada. Após essa Filda, apareceram em Angola 20 empresários sul-africanos que vieram para investir em ramos diferentes. Visitaram várias áreas como as linhas férreas, a defesa, entre outras. E, recentemente, os homens das linhas férreas estiveram novamente aqui em Angola para fazer o ‘follow up’ dos seus contactos no sentido de finalizar as negociações. E eles [empresários sul-africanos] viram uma oportunidade de negócio, porque o Governo angolano precisa de novas carruagens para reforçar a sua frota. E a África do Sul tem capacidade para fazer isso. Podíamos falar o dia inteiro para avaliar até que ponto a África do Sul quer investir em Angola. A Shoprite é outro exemplo. A Shoprite tem a meta de construir 50 lojas ao longo do país e já construiu 37 lojas em diferentes províncias.

Do lado angolano, haverá já empresa?ios que se deslocam à África do Sul para avaliar oportunidades de negócios?

A câmara de negócio de Angola e África do Sul poderá dar mais dados em relação a isso. A AIPEX poderá igualmente ceder mais dados a respeito.

Falemos globalmente das trocas comerciais...

Antes disso, há um assunto muito importante que gostaria de destacar, que está relacionado com a problemática das divisas. Muitas empresas não estão a conseguir repatriar os seus capitais por causa da falta de moeda estrangeira, que é um caso do conhecimento de todos. E este é um desafio que as empresas sul-africanas têm em atenção.

Nenhuma empresa sul-africana conseguiu repatriar?

Segundo o relatório que temos, embora exista o problema, algumas empresas sul-africanas conseguiram repatriar os seus capitais. A companhia aérea sul-africana teve essa dificuldade, mas conseguiu superar, após alguns meses, estando, neste momento, a aumentar a sua frota.

Quais são os números das trocas comerciais?

Aumentaram sustentavelmente. Isso significa que Angola é um parceiro estratégico, nesse momento, para a África do Sul. Até ao ano passado, a foi exportação para a África do Sul na ordem dos 67 mil milhões de rands. E a importação baixou para 17 mil milhões de rands. No geral, a troca comercial entre os dois países está avaliada em 25 mil milhões de rands.

O que a África do Sul exportou para Angola?

A África do Sul exporta mais produtos alimentares e medicamentos e Angola, por sua vez, exporta sobretudo petróleo. Mas é preciso lembrar que Angola não depende somente da África do Sul. Tem outros parceiros, como o Brasil, Portugal, entre outros.