Sonangol retoma centro tecnológico que foi alvo de investigação na Noruega
PETRÓLEO. Petrolífera pública recebeu 350 milhões de dólares para a construção do centro, mas ficou vários anos sem avançar com o projecto, provocando investigações internacionais. Agora anuncia a sua construção como se de um projecto novo se tratasse.
Questionamentos vindos da Noruega e a possibilidade de reabertura de investigações encerradas em 2017 terão precipitado a Sonangol a tirar da gaveta o projecto de construção do Centro de Investigação Científica e Inovação, de acordo com fonte familiar ao processo.
A petrolífera anunciou, na semana passada, a construção do centro sem fazer menção que se trata de um projecto antigo e que, inclusive, já foi alvo de investigação na Noruega. Em causa, estava a contribuição financeira da petrolífera Statoil (actual Equinor), detida em 70% pelo estado norueguês, para a construção do centro. O processo terá sido interrompido em 2017, mas, este ano, as autoridades norueguesas terão questionado a Sonangol sobre o dossier por notarem que o projecto continuava engavetado.
Fonte da petrolífera garante ao VALOR que foi este questionamento da Noruega a precipitar a decisão da Sonangol de anunciar o projecto. “A Sonangol vai construir, brevemente, um Centro de Investigação Científica e Inovação cujo objectivo será o de assessorar o seu conselho de administração na identificação de projectos estratégicos para a organização no âmbito do desenvolvimento do conhecimento”, anunciou a companhia como se de um projecto novo se tratasse.
O centro foi projecto em 2011 no âmbito das bases estratégicas para a exploração do pré-sal em Angola. O objectivo passava por desenvolver competências de modo a garantir “a manutenção dos recursos petrolíferos existentes e a descoberta das novas áreas para exploração”.
Na altura, ficou definido que os grupos empreiteiros dos blocos 19, 20,22, 24, 25, 35, 36, 37, 38, 39 e 40 contribuiriam para a criação do centro. Na sequência, empresas como a norueguesa Statoil, a BP e a Cobalt realizaram as respectivas contribuições. No total, entregaram 350 milhões de dólares à Sonangol, que, entretanto, não avançou com a construção do centro.
A situação chamou a atenção de algumas instituições internacionais de combate à corrupção, como é o caso da americana Global Witness. Em 2014, esta instituição, durante a cimeira EUA/África, em Washington, usou o projecto como exemplo para exigir maior transparência na relação entre as multinacionais e os governos. “Enquanto os chefes de governos africanos se reúnem em Washington DC para a Cúpula de Líderes EUA-África amanhã, há uma questão crucial que deve receber atenção: para onde vai o dinheiro dos negócios de recursos naturais – incluindo os USD 350 milhões pagos por empresas listadas nos EUA para um misterioso centro de pesquisas em Angola?”, questionava a organização, que havia pedido explicações à Sonangol, sem que a companhia, entretanto, se pronunciasse na altura.
Por sua vez, o parlamento norueguês de Oslo interrogou, em 2016, o então ministro norueguês de Petróleos e Energia, TordLien, sobre a contribuição da petrolífera Statoil para o referido projecto no valor de 50,6 milhões de dólares. Segundo notícias divulgadas na altura, tratava-se da quarta tentativa da comissão parlamentar para ouvir TordLien e esclarecer os contornos do negócio, que envolve ainda o pagamento de 700 milhões de coroas norueguesas (USD 84,3 milhões) em “contribuições sociais” indocumentadas. No mesmo período, as autoridades judiciais investigavam o caso.
Fonte da Sonangol garante ao VALOR que a referida investigação foi interrompida em 2017, quando a petrolífera converteu os 350 milhões em dólares e passou a enviar extractos, mensalmente, às autoridades norueguesas.
‘DESAPARECIMENTO’ DO DINHEIRO AFASTA FINANCIAMENTO
O VALOR apurou que a falta de esclarecimento, na altura, pela Sonangol, sobre o destino das contribuições financeiras das petrolíferas levou a Giek, agência financeira da Noruega, e a KSure, agência financeira da Korea, a desistirem da intenção de financiarem os dois barcos Drill Ship que a petrolífera pública comprou na Korea DSME, causando embaraços à Sonangol.
De acordo com o recente anúncio da Sonangol, a construção tem início previsto para 2021 e termo em 2022. E será parte de um Pólo de Investigação Científica e Tecnológica a ser criado por iniciativa do Ministério Recursos Minerais e Petróleos, com a colaboração da Agência Nacional de Petróleo e Gás, e operadoras multinacionais tal como a norueguesa Equinor (ex-Statoil). No relatório de 2019, a petrolífera refere ter em depósito bancário cerca de 200 mil milhões de kwanzas referentes às contribuições efectuadas para a construção do centro, incluídos juros.
“A Sonangol competia só com as empresas estrangeiras. Agora está a competir...