ANGOLA GROWING
MIRA CLOCK, ESCRITORA

“Angola vive momentos de muitas esperanças e desafios”

17 Jul. 2017 Marcas & Estilos

LITERATURA. Caracterizada pela forma intensa e romântica como escreve, Mira Clock, de 26 anos, é apaixonada pela escrita desde muito cedo. Com três obras publicadas, a jovem confessa que já foi “mais difícil” lançar livros em Angola. Em vésperas de eleições, acredita que Angola, apesar dos “desafios”, vive “momentos de muita esperança”.

 thumbnail thumbnail de5f837abcbd31354d614a6e7f41abef

Como entra na escrita?

Nasci com a paixão pela literatura. Escrever, para além de ser uma acção muito natural, faz parte de mim. A escrita é uma necessidade, preciso de escrever para me expressar. É a melhor terapia que encontrei para esvaziar o meu peito e a minha mente. O gosto surgiu com o hábito de leitura. Comecei a escrever poemas aos 11 anos. Mas só aos 17, quando ingressei no LEV´ARTE, é que decidi ser escritora.

O que a motivou a escrever poesia e prosa?

Sou sortuda, filha de dois professores que também são bons leitores. Sempre tive o apoio dos meus pais. Comecei a escrever poemas porque foi o meu primeiro amor literário. Após ter publicado o meu livro de poemas, ‘Desabrochar’, comecei a ler outros temas e a desenvolver o interesse por novos desafios literários. Faz-me falta a ansiedade de aprender e arriscar coisas novas.

É difícil publicar livros em Angola?

Já foi mais difícil. Hoje já vão surgindo algumas editoras com qualidade e boa dinâmica na prestação dos seus serviços. Mas ainda fica dispendioso para os escritores custearem os serviços de edição, paginação e impressão das suas obras em Angola. Os custos estão cada vez mais altos, o que não é diferente noutros segmentos de negócios, trata-se de uma fase menos favorável para a economia angolana.

Quais são as maiores dificuldades?

Relativamente à edição e impressão, já não encontro grandes dificuldades. O meu último livro, ao contrário dos anteriores, foi editado e impresso cá em Angola. Porém, a dificuldade que ainda persiste é a distribuição. Existem poucas empresas distribuidoras com capacidade para expandir os livros por todas as províncias.

O amor é um factor de inspiração?

O estado de espírito em que o escritor se encontra é muito importante e pode influenciar a escrita. A minha inspiração é algo que resulta, muitas vezes, de factores externos. O que transmite quando escreve? A minha visão sobre as coisas.

Que significado teve para si ‘Palavras’ e ‘Sete Pecados’?

Participar destas antologias foi muito importante e pesou muito na minha decisão de publicar o primeiro livro.

Como vê a literatura em Angola?

Gostaria de contribuir mais e estar viva para ver a cultura do livro instalar-se nos lares. Se eu tivesse algum poder de decisão, ou mais capacidade de influência, gostaria de diligenciar acções para um dia testemunhar o momento em que as bibliotecas e as livrarias tivessem tanta demanda como os clubes nocturnos e as discotecas.

Os escritores são reconhecidos?

Em regra, sim. A comunicação social ainda não concede a mesma projecção que dá a outros artistas aos escritores, mas este cenário já foi pior.

Vive da literatura? Infelizmente, não. Gostaria muito de me dedicar totalmente à literatura e ganhar dinheiro com a arte, mas ainda não é possível. É preciso que o mercado literário cresça e que a cultura do livro se instale com mais afinco.

Como concilia a literatura com o resto da sua vida?

À medida que os outros campos da minha vida vão ganhando mais espaço, começa a ser mais difícil dedicar-me à literatura. Mas não parei de escrever. É uma necessidade, tento gerir o tempo de modo a que seja possível escrever sempre.

Em que difere ‘Mira do Desabrochar’ de’ Mira de Vozes da Cidade’?

Desde o lançamento do Desabrochar passaram cinco anos e muita coisa se alterou. A Mira do ‘Desabrochar’ era uma menina que estava a começar universidade e tinha sonhos e expectativas. E o tipo de escrita era mais melancólico, romântico e subjectivo. Mira do ‘Vozes da Cidade’ é uma jovem mulher com passos cada vez mais precisos no mundo profissional, com objectivos e horizontes bem definidos.

Qual é a sua auto-avaliação?

Amadureci. Apesar de não ter deixado de sonhar, perdi um pouco da minha inocência: “A vida aconteceu em mim”.

Quais são as suas referências?

Mia Couto, Pepetela, Ondjaki, Eduardo Agualusa, Fernando Pessoa e Florbela Espanca são alguns dos escritores que mais influenciam o meu ser artístico. Há um novo livro a caminho? Na verdade, há dois livros a caminho: ‘Amor e Milagre’ e ‘Devaneios’.

Como avalia o contexto sociopolítico que Angola atravessa?

Verifica-se um clima de muitas expectativas e ansiedade por mudanças, o que é normal tendo em conta as circunstâncias. Nota-se o acumular de uma série de desafios sociopolíticos e metas macroeconómicas que se pretende atingir na próxima República. Angola vive momentos de muitas esperanças e desafios.

PERFIL

Ana Zulmira da Silva Ramalheira, ou simplesmente ‘Mira Clock’, nasceu em Luanda, há 26 anos. Licenciada em Direito pela Universidade Metodista de Angola. É membro executivo do Movimento Literário ‘Lev‘Arte’, no qual se inscreveu aos 17 anos. Começou a escrever os primeiros textos aos 11 anos. Em 2012, lançou o primeiro livro de poesia intitulado ‘Desabrochar’, em Fevereiro de 2014, escreveu crónicas e outros textos para o programa ‘Amanhã é outro dia’ da emissora Luanda Antena Comercial (LAC). Em 2015, lançou o romance ‘Cartas a um ex-amor’. No ano a seguir, lança o ‘Vozes da Cidade’.