ANGOLA GROWING
Lúcia de Almeida

Lúcia de Almeida

CONCERTO. É considerada a maior promotora de espectáculos acústicos em Angola. 12 milhões de kwanzas é o valor investido para a realização de uma edição. Para actuar, é necessário ser reconhecido e ter disco consagrado.

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Como surgiu o ‘Show do Mês´?

O ‘Show do Mês’ nasce em 2012. Estava a trabalhar num projecto completamente diferente, olhei para a estrutura do mercado e percebi que faltava um espectáculo diferente. Estávamos a viver uma fase em que os artistas de cartazes eram sempre os mesmos, em vários palcos. Criei o conceito e depois juntámos a equipa para desenvolver. Foi no intuito de fazer um ‘show’ diferenciado.

Não teve receio em executar a ideia?

Não. Aqui está um grande diferencial do ‘Show do Mês’: foi olhar para o mercado e perceber que existem vários nichos. Ou seja, também existem mil pessoas que gostam do Filipe Mukenga, e mil que gostam de Selda e tantos de outros… O mercado não vive apenas do que está a bater. Se assim fosse, Roberto Carlos, por exemplo, não teria público durante tantos anos. Isso encorajou-nos a não ter medo de arriscar, e principalmente de querer fazer diferente.

Que desafios enfrentou?

Muitos. Pessoais e profissionais. Não é fácil começar coisas novas e com uma filosofia nova, que possa ser entendida tanto por nós, pelo público e pelos próprios músicos, pois a filosofia do ‘Show do Mês’ é completamente diferente. Quando abordamos o músico, fazemo-lo dentro do projecto, do nosso esquema e métricas. Seleccionamos desde o repertório e tudo o que é esquematizado para o espectáculo. Foram desafios muito grandes, sobretudo devido a falta de ‘sponsor’ (patrocinador, em inglês) para um espectáculo que, à partida, é mais cultural que comercial.

Como é feita a selecção dos artistas?

O músico ou tem muito talento reconhecido por nós ou tem uma obra discográfica consagrada. Por isso, olhamos sempre para o músico que tem um disco com qualidade, mas que não tem muitos palcos para se exibir. Acabamos por selecionar não só o artista de cartaz, como também o convidado-surpresa. Depois, desejamos ter num espectáculo ou fazer outros tipos de conceitos como ‘Angola 70’, ‘Show Piô’, ou homenagens a músicos de outros estilos.

Já pensou em desistir por falta de apoios?

Já. Em 2015 anunciámos que seria o último espectáculo. Tínhamos a promessa de um apoio que não aconteceu.

Como deu volta à situação?

Foi aí que o banco Keve e a Global Seguros salvaram o ‘Show do Mês’. Foi numa altura em que a gente teria desistido, mas eles conseguiram suportar-nos da segunda temporada até ao fim. Depois, conseguimos fechar um acordo de parceria para 2016 e 2017.

Quem mais apoia o projecto?

Os grandes sustentos do projecto são no BAI Artes, o banco Keve, a Unitel, a Rádio Nacional de Angola e o hotel Royal Plaza. Estes conseguem ajudar a pagar cerca de 70% do espectáculo. Depois temos de procurar na bilheteira o resto.

Quanto custa produzir um espectáculo?

O ‘Show do Mês’ custa cerca de 12 milhões de kwanzas por edição. Estamos a falar de um espectáculo em que a gente cometeu o ‘erro’, saudável, de colocar a qualidade do espectáculo num patamar. E hoje, quando o público sai de casa para assistir ao ‘show’, não querem menos do que aquilo. Não estão dispostos a ver menos do que o esperado. Esta fórmula acabou por fazer com que investíssemos bem na luz, no som e na indumentária. Temos uma banda composta por 14 músicos. É difícil encontrar isso em Angola. Colocamos tudo aquilo que a música tem para dar a qualidade acústica necessária. Além disso, tem transmissão online. Hoje, o ‘Show do Mês’ é o maior explorador de música angolana ao vivo. Ou seja, tem mais de 40 espectáculos na Internet e de livre acesso, onde as pessoas podem baixar e guardar, pois é património de todos nós. Toda essa dinâmica e logística está aliada à uma equipa de mais de 50 pessoas.

E os rendimentos…

O ‘Show do Mês’ não tem bons rendimentos. Só conseguimos não ter dívidas.

Qual foi o espectáculo mais difícil de fazer?

Cada espectáculo é um espectáculo. Há ‘shows’ com uma complexidade muito grande. Por exemplo, ‘Vozes de Março’: mulheres são estrelas por si só; é sempre muito complexo de fazer por causa das fórmulas do espectáculo. Mas o mais difícil, e ao mesmo tempo muito prazeroso de produzir, foi o ‘Cantar André Mingas’.

Porquê?

Pela complexidade e pela grandeza do próprio artista. Além disso, tínhamos uma expectativa muito grande. Na altura mudámos de banda e havia muita expectativa em perceber se o espectáculo havia de continuar com o mesmo padrão ou não. Superou as expectativas e retirou-nos o medo.

O que aconteceu com a parceria com a Banda Maravilha?

Trabalhámos juntos da primeira temporada até ao meio da segunda. Havia uma parceria óptima, só que, num determinado momento, o grupo acabou por precisar de ter um aumento de quase 80% do seu ‘cash’ e nós não conseguimos pagar. Entretanto, juntamos outros músicos e hoje montamos a banda do ‘Show do Mês’.

Como anda o mercado musical angolano?

Estagnado. Existe uma mutação de públicos. Há muito público novo para um tipo de música e, principalmente, um público que quer estar com os seus artistas, mas não sabe onde estar. Ou seja, existem três classes de músicos: os que vêm da independência, os que saem dos anos 80 até hoje e o novo público. Falta cada vez mais estruturação de mercado. Tivemos um ‘boom’ económico de artistas a fazerem espectáculos em Portugal, muitos discos, mas a estrutura de mercado, produtoras e produtos não aconteceu. Tivemos tanto dinheiro, mas ninguém fez uma fábrica de discos em Angola. Continuamos a gravar fora. Investiu-se em paredes e máquinas, mas faltou investir no homem. Se isso tudo não ficar harmonizado, os produtores não têm muito para fazer.

Perfil

Nome: Yuri Watayua Leopoldo Simão

Data de nascimento: 2 de Julho

Naturalidade: Luanda

Formação: Licenciatura em Comunicação Social

Estado civil: Casado

Filhos: Dois

Clube desportivo: Petro de Luanda

Um artista: Não tenho

LITERATURA. Caracterizada pela forma intensa e romântica como escreve, Mira Clock, de 26 anos, é apaixonada pela escrita desde muito cedo. Com três obras publicadas, a jovem confessa que já foi “mais difícil” lançar livros em Angola. Em vésperas de eleições, acredita que Angola, apesar dos “desafios”, vive “momentos de muita esperança”.

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Como entra na escrita?

Nasci com a paixão pela literatura. Escrever, para além de ser uma acção muito natural, faz parte de mim. A escrita é uma necessidade, preciso de escrever para me expressar. É a melhor terapia que encontrei para esvaziar o meu peito e a minha mente. O gosto surgiu com o hábito de leitura. Comecei a escrever poemas aos 11 anos. Mas só aos 17, quando ingressei no LEV´ARTE, é que decidi ser escritora.

O que a motivou a escrever poesia e prosa?

Sou sortuda, filha de dois professores que também são bons leitores. Sempre tive o apoio dos meus pais. Comecei a escrever poemas porque foi o meu primeiro amor literário. Após ter publicado o meu livro de poemas, ‘Desabrochar’, comecei a ler outros temas e a desenvolver o interesse por novos desafios literários. Faz-me falta a ansiedade de aprender e arriscar coisas novas.

É difícil publicar livros em Angola?

Já foi mais difícil. Hoje já vão surgindo algumas editoras com qualidade e boa dinâmica na prestação dos seus serviços. Mas ainda fica dispendioso para os escritores custearem os serviços de edição, paginação e impressão das suas obras em Angola. Os custos estão cada vez mais altos, o que não é diferente noutros segmentos de negócios, trata-se de uma fase menos favorável para a economia angolana.

Quais são as maiores dificuldades?

Relativamente à edição e impressão, já não encontro grandes dificuldades. O meu último livro, ao contrário dos anteriores, foi editado e impresso cá em Angola. Porém, a dificuldade que ainda persiste é a distribuição. Existem poucas empresas distribuidoras com capacidade para expandir os livros por todas as províncias.

O amor é um factor de inspiração?

O estado de espírito em que o escritor se encontra é muito importante e pode influenciar a escrita. A minha inspiração é algo que resulta, muitas vezes, de factores externos. O que transmite quando escreve? A minha visão sobre as coisas.

Que significado teve para si ‘Palavras’ e ‘Sete Pecados’?

Participar destas antologias foi muito importante e pesou muito na minha decisão de publicar o primeiro livro.

Como vê a literatura em Angola?

Gostaria de contribuir mais e estar viva para ver a cultura do livro instalar-se nos lares. Se eu tivesse algum poder de decisão, ou mais capacidade de influência, gostaria de diligenciar acções para um dia testemunhar o momento em que as bibliotecas e as livrarias tivessem tanta demanda como os clubes nocturnos e as discotecas.

Os escritores são reconhecidos?

Em regra, sim. A comunicação social ainda não concede a mesma projecção que dá a outros artistas aos escritores, mas este cenário já foi pior.

Vive da literatura? Infelizmente, não. Gostaria muito de me dedicar totalmente à literatura e ganhar dinheiro com a arte, mas ainda não é possível. É preciso que o mercado literário cresça e que a cultura do livro se instale com mais afinco.

Como concilia a literatura com o resto da sua vida?

À medida que os outros campos da minha vida vão ganhando mais espaço, começa a ser mais difícil dedicar-me à literatura. Mas não parei de escrever. É uma necessidade, tento gerir o tempo de modo a que seja possível escrever sempre.

Em que difere ‘Mira do Desabrochar’ de’ Mira de Vozes da Cidade’?

Desde o lançamento do Desabrochar passaram cinco anos e muita coisa se alterou. A Mira do ‘Desabrochar’ era uma menina que estava a começar universidade e tinha sonhos e expectativas. E o tipo de escrita era mais melancólico, romântico e subjectivo. Mira do ‘Vozes da Cidade’ é uma jovem mulher com passos cada vez mais precisos no mundo profissional, com objectivos e horizontes bem definidos.

Qual é a sua auto-avaliação?

Amadureci. Apesar de não ter deixado de sonhar, perdi um pouco da minha inocência: “A vida aconteceu em mim”.

Quais são as suas referências?

Mia Couto, Pepetela, Ondjaki, Eduardo Agualusa, Fernando Pessoa e Florbela Espanca são alguns dos escritores que mais influenciam o meu ser artístico. Há um novo livro a caminho? Na verdade, há dois livros a caminho: ‘Amor e Milagre’ e ‘Devaneios’.

Como avalia o contexto sociopolítico que Angola atravessa?

Verifica-se um clima de muitas expectativas e ansiedade por mudanças, o que é normal tendo em conta as circunstâncias. Nota-se o acumular de uma série de desafios sociopolíticos e metas macroeconómicas que se pretende atingir na próxima República. Angola vive momentos de muitas esperanças e desafios.

PERFIL

Ana Zulmira da Silva Ramalheira, ou simplesmente ‘Mira Clock’, nasceu em Luanda, há 26 anos. Licenciada em Direito pela Universidade Metodista de Angola. É membro executivo do Movimento Literário ‘Lev‘Arte’, no qual se inscreveu aos 17 anos. Começou a escrever os primeiros textos aos 11 anos. Em 2012, lançou o primeiro livro de poesia intitulado ‘Desabrochar’, em Fevereiro de 2014, escreveu crónicas e outros textos para o programa ‘Amanhã é outro dia’ da emissora Luanda Antena Comercial (LAC). Em 2015, lançou o romance ‘Cartas a um ex-amor’. No ano a seguir, lança o ‘Vozes da Cidade’.

PATRIMÓNIO CULTURAL. Chefe de departamento do Instituto Nacional do Património Cultural (INPC), Emanuel Caboco, em entrevista ao VE, admitiu que muitos edifícios históricos estão em avançado estado de degradação e carecem de intervenção urgente. E alertou que uma requalificação dos monumentos pode descaracterizar a história do país.

 

Qual é o número de bens históricos e culturais classificados em Angola?

Estão classificados, como Património Histórico e Cultural, 264 bens.

De que tipologia são?

De variada tipologia. Além do património edificado ou arquitectónico, composto pelos monumentos de arquitectura civil, militar, religioso, funerário e industrial, estão classificados vários conjuntos urbanos, centros históricos, sítios históricos e arqueológicos, bem como paisagens culturais.

Qual é a importância da sua classificação?

A classificação é uma medida de carácter jurídico e administrativo. Torna-se importante na medida em que visa assegurar e salvaguardar os bens culturais. E esse acto é tomado independentemente da sua natureza, idade, localização ou propriedade do bem. Quanto aos critérios, são vários, assentam sobre dois pilares fundamentais: a avaliação do carácter histórico, artístico e estético-estrutural e a avaliação das qualidades de autenticidade e de integridade dos bens.

Quem os classifica?

Os bens são identificados e inventariados pelos órgãos da Administração Local do Estado. Depois do inventário, o bem é documentado. A classificação só ocorre depois de publicado no Diário da República.

E como um património nacional passa a mundial?

A análise de qualquer bem para o seu reconhecimento como Património Mundial passa pela observação do seu Valor Universal Excepcional, que é definido pelos dez critérios em vigor na Convenção da UNESCO de 1972. Mas o primeiro requisito é a inclusão do bem na Lista Indicativa do país junto da UNESCO.

O que difere o monumento natural do património cultural histórico?

Os sítios naturais são caracterizados pela paisagem natural com uma importância ou beleza natural extraordinária ou que seja ainda resultado das obras combinadas entre o homem e a natureza. Já um sítio histórico-cultural pode ser distinguido pela qualidade de testemunho histórico ou cultural do homem correspondente à sua homogeneidade e interesse do ponto de vista histórico ou factual, científico e lendário.

Que importância tem um património cultural para o país?

Para conhecermos um povo, recorremos, regra geral, à análise quanto aos seus hábitos e costumes, suas manifestações espirituais, seus valores e sua história – o que entendemos hoje como cultura. Muitos edifícios históricos estão degradados.

Que medidas o Ministério da Cultura tem tomado para que sejam requalificados?

Há, na realidade, um número ainda elevado de edifícios de valor patrimonial bastante degradados. Os constrangimentos orçamentais obrigaram o Estado a uma racionalização dos investimentos. Sendo assim, registou-se uma desaceleração na recuperação. Contudo, já foi possível implementar uma recuperação ao património. Por exemplo, o edifício da escola Mutu ya Kevela, o Palácio de Ferro, as Ruínas históricas de Cambambe, a Fortaleza de São Miguel, o Palácio das Telecomunicações e muitas outras edificações acabaram por beneficiar de obras de revalorização patrimonial.

Que monumentos são considerados prioridade em termos de intervenção?

Estamos preocupados com a situação das outras duas fortalezas de Luanda, nomeadamente, o Forte de São Pedro da Barra e o Forte do Penedo (antiga casa de reclusão); o Forte da Katumbela, do Forte de São Fernando, no Namibe, os monumentos de Masangano, e várias outras edificações.

A restauração de monumentos não desvirtua a história?

Sim, a requalificação de monumentos históricos descaracteriza a nossa história. Cada vez mais, os monumentos históricos mal intervencionados acabam por ofuscar a paisagem básica das nossas cidades. Estas acabam por desvirtuar a fisionomia da paisagem urbana e histórica das nossas cidades.

E do ponto de vista da sensibilização, o que tem sido feito?

O acesso à informação sobre o património é feito de diversas formas: pela escola, pela administração pública mas também pelos órgãos de comunicação social. Considero que a visão do INPC, que tem como objectivo a preservação do património, fica limitada pelo olhar do técnico que nem sempre coincide com o olhar do educador. Se a educação patrimonial consiste na construção de uma ideologia, apologia ou atitude preservacionista, entendemos que também devia ser revisto o papel da imprensa e da escola.

PATRIMÓNIO CULTURAL HISTÓRICO

Igreja Nossa Sr.ª da Muxima, Bengo

Fortaleza da Muxima, Bengo

Igreja Nossa S.ª do Pópulo, Benguela

Jardim da Pouca-Vergonha, Bié

Igreja de Tchiowa, Cabinda

Foz do Rio Chiloango, Cabinda

Memorial do Rei Mandume, Cunene

Morro do Moco, Huambo

Fendas de Tundavala, Huíla

Palácio do Governo Provincial, Kuando-Kubango

Forte de Massangano, Kwanza-Norte

Ruínas Fortaleza Kibala, Kwanza-Sul

Hospital Josina Machel, Luanda

Museu do Dundo, Lunda-Norte

Governo da Lunda-Sul

Sé Catedral, Malanje

Jardim do Palácio do Governador, Moxico

Pedra do Feitiço, Zaire

Museu de Antropologia, Luanda

Palácio de Ferro, Luanda

Igreja Do Carmo, Luanda

Igreja Nossa Sr.ª Nazaré, Luanda

Igreja Nossa Sr.ª dos Remédios, Luanda

Igreja Nossa Sr.ª do Carmo, Luanda

Palácio D. Ana Joaquina, Luanda

Museu de História Natural, Luanda

Museu Nacional de Antropologia, Luanda

Museu da Escravatura, Luanda

Fortaleza de S. Miguel, Luanda

Banco Nacional de Angola, Luanda

ENTREVISTA. Afastou-se dos palcos por muito tempo, para se especializar em dermatologia, no Brasil. Aos 34 anos, Erica Nelumba “nunca tentou viver da música”, porém, acredita ser possível viver desta arte. A cantora, e também médica, entende que a falta de um sector empresarial “forte” no entretenimento condiciona a internacionalização dos músicos angolanos.

 

Ausentou-se por algum tempo para se dedicar à medicina. Valeu a pena?

Com certeza! O meu objectivo era concluir a minha formação em medicina (licenciatura e especialização) até aos 32 anos e assim o fiz. Infelizmente, tive de abdicar temporariamente da minha carreira como cantora, mas não há ganhos sem sacrifícios.

Prometeu lançar o 3.º álbum em 2016…

Realmente o objectivo era esse. Porém, tive alguns contratempos relativos à minha agenda profissional (como médica), que não permitiram que me ausentasse do país. Queria muito trabalhar com alguns músicos, que, infelizmente, não residem em Angola.

Vive dividida entre a música e a medicina. Como concilia?

Tentando equilibrar o tempo que dedico a uma e a outra. Gosto de ambas, pois nelas exploro lados completamente diferentes da minha personalidade. Então, ainda que esteja física ou psicologicamente cansada, consigo arranjar ânimo para continuar.

Onde se sente mais confortável: no consultório ou em palco?

Em qualquer um deles. Mas confesso que fico sempre nervosa antes de subir ao palco.

E onde vê maiores possibilidades de ascensão social?

Na verdade, não penso nisso. Tenho uma carreira musical porque gosto de cantar e tenho talento, e uma carreira médica porque gosto de cuidar das pessoas e estudei para tal. Tudo o que vier daí é resultado do amor e dedicação que ponho em tudo o que faço.

É possível viver só da música em Angola?

Nunca tentei (risos), mas penso que sim. Quando está no consultório, é reconhecida? Sou, sim. Quase sempre. É bom porque acabo por ter um contacto directo com os apreciadores da minha música e não só. Recebo sempre muito carinho.

O facto de ser médica condiciona a música?

De certa forma, sim. Por exemplo, gostaria de ter mais tempo para poder praticar e dominar um instrumento musical ou ter aulas para aperfeiçoar a voz, mas é difícil encontrar espaço para fazer isso.

A sua família influenciou na decisão entre ser cantora e médica?

Não. Os meus pais fazem as suas sugestões, mas apoiam e respeitam as minhas decisões.

Que dificuldades teve para lançar o seu primeiro álbum?

Quase nenhuma, uma vez que o Beto Max (na altura meu produtor), cuidava de tudo (risos). Era tudo muito novo para mim.

O que falta para haver mais músicos angolanos reconhecidos internacionalmente?

Falta um sector empresarial forte no entretenimento, que entenda que a música também é um negócio que pode ser muito rentável, de acordo com grau de investimento e com o potencial do produto apresentado.

Sente que o número de fãs reduziu após a ausência dos palcos?

É uma pergunta difícil de responder, porque eu não sei como comparar. Mas os que foram voltarão (risos).

O que é mais difícil: ter reconhecimento dos fãs ou de organizadores de eventos?

É mais difícil ter o reconhecimento dos fãs, pois tens que os tocar de alguma forma e eles, por sua vez, são capazes de ‘obrigar’ um organizador de eventos a reconhecer o teu potencial.

Que desafios teve ao interpretar a música ‘Filha de Deus’?

Foi uma música difícil de interpretar, pois o tema em si fugia um pouco daquilo que eu estava acostumada a cantar. Mas sinto um prazer enorme sempre que canto essa música.

A música ‘Tua’ é dedicada a alguém em especial?

É sim. Aos meus fãs.

Quais são as suas referências musicais?

Actualmente, nenhuma. Oiço de tudo um pouco.

Como avalia o contexto sociopolítico que Angola atravessa (cenário eleitoral)?

Penso que é a reafirmação de que temos realmente um Estado democrático e de direito. Teremos a oportunidade de escolher quem vai liderar os nossos destinos nos próximos cinco anos, portanto, é um momento de reflexão, para que possamos fazer a melhor escolha.

Que papel os músicos podem desempenhar para a consciencialização da sociedade diante desta realidade?

Os músicos, assim como outras figuras que gozam de alguma visibilidade, tais como desportistas, por exemplo, são vistos como modelos a seguir, principalmente pelos mais jovens. Devemos usar essa visibilidade para melhorar a nossa sociedade, através dos nossos próprios exemplos.

E as mulheres, em particular, têm uma palavra a dar?

Com certeza! As mulheres têm o poder de moldar a sociedade, de acordo com a educação que oferecem aos seus filhos.

 

PERFIL

Nome completo: Erica Judite Pimentel Nelumba

Data de Nascimento: 19 de Maio de 1983

Naturalidade: Luanda Estado

Civil: divorciada

Filhos: nenhum

Cor: branca

Um músico: Michael Jackson

CINEMATOGRAFIA. Há 30 anos no cinema, e com mais de 10 filmes e documentários realizados, Ezequiel Pedro confessa não ser fácil filmar em Angola. A “falta de sensibilidade e o desprazimento pela arte” são os principais motivos. Apesar disso, consegue superar as dificuldades. E prepara a estreia do documentário ‘Histórias do Deserto’.

 

Aos 50 anos, Ezequiel Pedro tem a sua vida dedicada à realização de documentários. A paixão pelo cinema começou cedo. Com 20 anos, por iniciativa do Instituto Angolano de Cinema, o autor do ‘Comboio da Canhoca’ partiu para Cuba onde se formou em Produção de Cinema e de Televisão. Ao regressar a Angola vê o sonho de realizar filmes quase que destruído, pois o Laboratório de Cinema acabava de ser exterminado.

Foi então que passou a ver a ficção como uma “ilusão”, o que o ‘forçou’ a trabalhar na realização de documentários. “Enveredei no documentário porque a ficção é uma utopia, ninguém dá dinheiro para produzir um filme em Angola. Mas se aparecer um estrangeiro a produzir um filme, no país, vai surgir dinheiro até em fundos próprios”, justifica o realizador.

Quadro do cinema angolano, Ezequiel Pedro afirma que, outrora, havia mais oportunidades de gravação e produção de filmes. “Hoje não conseguimos produzir um documentário por ano. Por falta de sensibilidade e por não se conseguir pôr as pessoas certas nos lugares certos, como resultado existe um certo desprazimento”, confessa.

O cineasta recorda que, ao tempo do partido único, o cinema tinha sempre um orçamento. E os projectos eram aprovados e financiados de dois em dois anos. Ezequiel Pedro lamenta o facto de isso não acontecer nos dias de hoje. E culpa o Instituto Nacional de Cinema e o Ministério da Cultura por terem dificuldades de aprovar um projecto cinematográfico.

Apesar de acreditar no profissionalismo dos colegas, o realizador reconhece que o cinema feito em Angola ainda é muito ‘arrojado’, “não tem pessoas sensíveis e capazes de aceitar projectos. O cinema requer dinheiro e, se não há dinheiro, não há filmes com qualidade”.

Por ser uma das artes mais caras Ezequiel Pedro defende que , para não permanecer dependente de patrocínios, se criem políticas de protecção para salvaguardar o seu desenvolvimento. Por outro lado, tem esperanças que as próximas gerações de criadores “vão encontrar um local limpo e bem iluminado”. Namibe em documentário A proposta do documentário ‘Histórias do Deserto’ surgiu com o objectivo de retratar, de forma cinematográfica, as potencialidades da província do Namibe. Em causa está o turismo, agricultura, a beleza do deserto e do mar, entre outras riquezas que a terra da Welwitschia Mirabilis oferece.

Com o apoio do Ministério de Hotelaria e Turismo e do governo do Namibe, a realização do documentário ‘Histórias do Deserto’, ficou avaliada em 258 mil dólares e a sua finalização está prevista para Julho deste ano.

O seriado segue numa das fases mais ‘perigosas’ da sua realização, a pré-produção. Toda a equipa envolvida no projecto está na ‘luta’ da selecção de locações e de todas as áreas que possam dar garantias de que o Namibe é um potencial em todas as vertentes, não só do ponto de vista do deserto e do mar. Segundo o realizador Ezequiel Pedro, as gravações terão a duração de 40 dias, e vão poder contar com sugestões do público a fim de se tornar o conteúdo do documentário “mais enriquecido”.

 

Filmografia

 

O comboio da Canhoca

Quem faz correr Quim Caravana

O grito I

O grito II

O grito III

Sabor a mim

Os Kamussekele

Os Himbas

Os Autóctones do sul de Angola

Okavango – Zambeze

 

PERFIL

 

Ezequiel João Sebastião Pedro é formado em Cinema e Televisão pela Escola Internacional de Cine e Televisão de San António de los Baños, em Cuba. Actualmente, trabalha como realizador de documentários na Televisão Pública de Angola. É coordenador do curso de cinema, rádio e tv da Escola Nacional de Formação Artística (DINFA), em Luanda. Também é membro do novo cine latino-americano e integrante da rede internacional Laureate. Representou Angola na produção e realização do maior filme de África, intitulado ‘Caravana’.