Nelson Rodrigues

Nelson Rodrigues

BANCA. Prejuízo de quase 30 mil milhões de kwanzas no balanço do ano passado não trava alargamento do activo da entidade em 26,2%, o maior de toda a banca. O resultado líquido negativo deriva da constituição de 72,7 mil milhões para o crédito perdido e da prevenção de futuras perdas. A administração do banco apresenta nova estratégia.

 

O Banco de Poupança e Crédito (BPC) é o único entre os cinco maiores em activos que fechou o balanço de 2016 com perdas, que ficaram avaliadas em 29,5 mil milhões de kwanzas, as primeiras nos últimos 16 anos, de acordo com os vários relatórios do banco desde 2001 e buscas do VALOR.

A administração do banco liderado por Ricardo d’Abreu justifica as perdas com a constituição de 72,7 mil milhões de kwanzas para o crédito perdido (por imparidades) e provisões para eventuais perdas. “Esta iniciativa será reforçada em 2017, com o intuito de assegurar o saneamento efectivo da carteira de crédito do banco e atingir um rácio de transformação abaixo dos 70,0%”, explica um documento que resume a situação patrimonial da instituição, nos 12 meses do ano passado.

Se os resultados líquidos fecham negativos, o activo do banco suportado pelo Estado faz caminho inverso. De acordo com um quadro síntese da situação financeira do banco, o activo líquido situou-se nos 1,6 biliões de kwanzas, precisamente 1.691,1 mil milhões. Ou seja, houve um crescimento de 26,2% face às margens alcançadas em 2015, apenas de 1,3 biliões. Este valor volta a reforçar a liderança do BPC no ‘ranking’ dos cinco maiores em activos. Assim, a lista dos ‘Big five’ fica integrada pelo BPC (1,6 biliões), o Banco Angolano de Investimento (BAI), com 1,4 biliões de kwanzas, afastando o Banco de Fomento Angola (BFA) do segundo lugar, agora no terceiro, com 1,3 biliões.

O Banco BIC, com mais de um bilião, e o Millennium Atlântico, com 948,4 mil milhões, fecham o ‘ranking’ de 2016. No documento que compila a situação patrimonial do ano passado, o novo conselho de administração, sob a gestão de Ricardo d’Abreu, não esconde as actuais condições do banco. “A situação financeira do Banco é desafiante. Em resultado do processo de saneamento e reestruturação, o conselho de administração do banco procurará recuperar os prejuízos registados no Exercício de 2016 agora apresentado”, afirma a equipa de Ricardo d’Abreu, nomeada há pouco menos de 60 dias, pela assembleia-geral de accionistas do banco. Apesar das perdas e do mau momento operacional do BPC, a nova gestão considera que há “indicadores positivos que reflectem o papel do banco no sistema financeiro angolano”, desde a confiança dos clientes a dos accionistas.

De acordo com o banco, a confiança dos clientes é traduzida pelas margens de depósitos, que, segundo os números saídos do último exercício financeiro, aumentaram em mais de 12%.

A par dos clientes, estão os accionistas – Estado, com 75%; Instituto Nacional de Segurança Social, com 15%; Caixa de Segurança Social das Forças Armadas Angolanas (FAA), com 10% – que reforçaram a confiança à gestão do banco, com reforço dos fundos próprios em mais 26,9%.

MELHORIAS NA OPERAÇÃO

As operações do dia-a-dia, traduzidas no crescimento das margens financeiras e do produto bancário, também mereceram destaque do novo ‘board’ do banco, por registarem, de Janeiro a Dezembro, subidas de 24,8% e 8,5%, respectivamente, apesar da redução em 19,9% das margens complementares.

Não escapou à avaliação dos gestores o crescimento do activo líquido, nem o aumento em 7,9% da base de clientes, num período conturbado para o banco, devido às várias movimentações na administração do banco, em espaço de tempo reduzido.

“Estes indicadores reforçam a importância da instituição, sobretudo o papel do BPC como um elemento de suporte à soberania de Angola, constituindo-se num activo determinante para a consolidação e diversificação da nossa economia”, congratulam-se os gestores de topo do banco, em referência aos números do exercício do balanço de 2016.

Recapitalização é para continuar

A nota do banco a que o VALOR teve acesso diz que, de acordo com os princípios de avaliação recomendados pelos accionistas, pela entidade de supervisora, pelo comité de monitorização do saneamento e reestruturação do BPC e as boas práticas internacionais, o “conselho de administração irá concentrar os seus esforços na implementação efectiva do Plano de Recapitalização e Reestruturação do banco”, baseado no aumento do capital social, no montante de 90 mil milhões de kwanzas.

A venda da carteira de saneamento à Recredit (entidade criada para gerir o malparado do banco e similares), “efectuada por contrapartida de obrigações do tesouro, com o valor de 231 mil milhões de kwanzas”, e a “emissão de instrumentos de dívida subordinada convertível elegíveis para fundos próprios base, no valor global de 72 mil milhões de kwanzas” integram a estratégia de reestruturação do banco, entidade que já vem de outras ajudas do Estado.

“O conselho de administração está ciente dos desafios que tem pela frente, e acredita genuinamente, que num contexto normal de evolução do mercado, o BPC irá voltar a liderar o sistema financeiro angolano, no apoio às famílias, às instituições e às empresas nacionais”, concluiu a administração do banco.

BANCA. Quase um ano depois do aval das autoridades angolanas, a sucursal do Banco da China em Luanda arranca esta segunda-feira. Sede operacional será em Talatona e operações de crédito e outras transacções arrancam apenas em Agosto.

 

Banco da China (BOC) anunciou, para esta segunda-feira, a inauguração da sua primeira sucursal em Angola, marcando a entrada do primeiro banco asiático no país e prevendo transacções em moeda extrangeira para o terceiro trimestre do ano.

De acordo com uma estratégia do banco referida pela Agência Lusa, a sede operacional da sucursal angolana estará localizada no distrito urbano de Talatona, em Luanda, com abertura operacional agendada para o dia seis deste mês. Da estratégia inicial operacional, consta ainda a ideia de prolongar o processo de captação de clientes corporativos até final de Julho.

Já em Agosto, arrancam as operações em moeda nacional, como transacções a débito e crédito ou concessão de empréstimos, seguindo-se a partir de Outubro transacções sobre o exterior, em euros e dólares.

Um dos objectivos da entrada dos chineses do BOC ao país passa por garantir que as transacções entre a China e Angola se façam sem recurso a uma terceira moeda, como o dólar ou o euro, estratégia várias vezes debatidas entre os operadores dos mercados e empresários locais.

Aliás, os bancos centrais de Angola e da China anunciaram anteriormente que estão a acertar os termos de um eventual acordo para permitir o uso das moedas nacionais de ambos os países, nas trocas comerciais bilaterais. A concretizar-se, esse entendimento permitirá que os agentes económicos de ambos os países possam usar a moeda chinesa (renminbi ou yuan) em Angola e a angolana (kwanza) na China, facilitando as trocas comerciais.

O banco, que é uma das maiores instituições financeiras mundiais, eleva, assim, para 30 o número de instituições bancárias no país, pouco menos de três meses desde a inauguração do Banco Postal.

A entrada dos chineses do BOC segue-se a uma autorização do Governo, que, em Maio do ano passado, permitiu a abertura de uma filial desta entidade oriental no país, para desenvolver actividade financeira bancária.

A autorização consta de um decreto assinado pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, de 13 Maio do mesmo ano, que adianta que a instituição detida pelo Estado chinês vai operar no país com a designação Banco da China - sucursal em Angola.

A abertura da sucursal angolana do Banco da China acontece numa altura em que persistem fortes constrangimentos de natureza financeira no país, devido à crise da cotação do petróleo, nomeadamente no acesso a divisas, colocando em causa transferências para o estrangeiro ou a importação de matéria-prima.

O governador do Banco Nacional de Angola (BNA), Valter Filipe, reconheceu, anteriormente, que a banca do país está a ser colocada “à margem” do sistema financeiro mundial, numa aparente alusão à falta de acesso dos bancos angolanos ao circuito internacional de divisas, por dúvidas dos reguladores internacionais sobre credibilidade das instituições angolanas.

Criado em 1912, o Banco da China funcionou até 1949 como banco central chinês. Após várias transformações, ainda nas mãos do Estado mas já como banco comercial, tem vindo a concentrar atenções no apoio às empresas e comunidades chinesas fora do país, com destaque para as economias emergentes.

 

*Com Agência Lusa

RESULTADOS. Instituição associada a Álvaro Sobrinho não conseguiu provar, documentalmente, pela segunda vez, titularidade de um conjunto de imóveis declarado no seu balanço patrimonial dos anos 2015 e 2016. A reincidência obrigou a mais uma nota negativa das ‘mãos’ da Ernest &Young. O banco reconhece e já planeia despachar imóveis para ‘contornar’ o problema.

 

As contas de balanço do Banco Valor voltaram a encerrar o exercício financeiro de 2016 com mais uma reserva, a segunda em 24 meses, devido à falta de comprovativos sobre a titularidade pelo banco de um número não determinado de imóveis, de acordo com um parecer independente da Ernest&Young e uma nota explicativa do conselho fiscal às contas da entidade.

A reserva resulta de um contrato de compra e venda de imóveis, celebrado entre o banco e uma entidade não identificada, em finais de 2013 e no primeiro semestre de 2014, inscrito nas rubricas outros valores e imobilizado corpóreo, com valores a ascenderem, a 31 de Dezembro do ano passado, a 3.348 milhões de kwanzas e 290 milhões, respectivamente.

“Até à presente data, não foram realizadas as respectivas escrituras e não obtivemos evidência documental comprovativa da transferência da titularidade dos imóveis para o banco, nem documentação legal vinculativa que permita ao banco irrevogavelmente aventar, no futuro, as aquisições a seu favor, na conservatória do registo predial”, mostram os peritos auditores da Ernest & Young.

Esta é a segunda vez, desde 31 de Dezembro 2015, que o banco atribuído a Álvaro Sobrinho fecha as contas de balanço com reservas relacionadas com os activos fixos, nomeadamente na aquisição de imóveis sem a respectiva documentação comprovativa. No parecer do conselho fiscal às contas de 2016, o banco reconhece a existência da reserva e confirma que a mesma já tinha sido notificada em 2015, referente às “limitações identificadas quanto aos imóveis que foram objecto de contratos promessa de compra e venda, celebrados com partes relacionadas, nos exercícios 2013 e 2014”.

“As referidas limitações [no balanço de 2016] prendem-se com as eventuais contingências associadas ao registo da titularidade dos imóveis, dada a falta de evidência documental que suporte a transferência efectiva da sua propriedade para o banco”, admite o conselho fiscal, em nota explicativa, também anexas às contas do banco, assinada por Fátima Cristina Barroso, presidente, e mais dois vogais. Já em 2015, as reservas foram detectadas “por limitação de âmbito devido ao facto de não ter sido possível obter avaliações externas e independentes para todas as fracções que haviam sido objecto de contrato promessa de compra e venda com partes relacionadas”.

A ‘chamada de atenção’ dos auditores estende-se ao facto de que os imóveis em questão se encontrarem vagos há mais de 2 anos. Ou seja, o banco não dá utilidade às fracções dos imóveis há um período fora do limite estabelecido pelo Banco Nacional de Angola (BNA), medida prevista no artigo 13.º da lei das instituições financeiras, que também proíbe a aquisição pelos bancos de imóveis que não sejam os indispensáveis à sua actividade.

Para contornar a situação dos imóveis, o conselho fiscal garante que o banco tenciona vender as unidades, mecanismo encontrado para evitar as recorrentes reservas pelo auditor e a violação do artigo 13.º previsto na lei das instituições financeiras.

À reserva de 2016, somam-se mais duas “ênfases” relacionadas com a “definição formal de um processo que se destina a assegurar que as novas transacções com partes relacionadas não potenciam conflitos de interesses” e estejam em conformidade com o artigo 7º do aviso 2/13, de Junho, do banco central.

RESULTADOS NÃO PARAM DE SUBIR 

Apesar das notas negativas ao balanço patrimonial, o banco registou resultados líquidos positivos acima de mil milhões de kwanzas, precisamente 1.055.418 milhões, além de ter visto alargar o seu activo total em 46,7% para 33.624 milhões de kwanzas, face às margens alcançadas em igual período anterior.

É a segunda vez, desde o início de operações, que o banco fecha a contabilidade com lucros. Até 31 Dezembro de 2011, as contas do Banco Valor registavam um resultado líquido negativo de 287,8 milhões de kwanzas e 1.163,2 milhões kwanzas (também negativos) em 2012. As tendências foram as mesmas para os dois anos seguintes: - 1.163,2 milhões kwanzas e -3.314,1 milhões de kwanzas.

O ano de 2015 foi o início da marcha para os lucros, com as contas a registarem 367,6 milhões de kwanzas. O desempenho positivo prossegue em 2016, motivado pelas margens financeiras, que chegaram a dois mil milhões de kwanzas e o resultado das operações cambiais, que se fixou nos 727,2 milhões de kwanzas.

BANCA. Ausência de uma assembleia-geral de accionistas estará a impedir o registo das acções no novo accionista do SBA no BNA. O regulador estará à espera de documentação solicitada ao banco desde Agosto do ano passado.

 

A gestão do Standard Bank Angola (SBA) está sob controlo exclusivo do accionista sul-africano há, pelo menos, dois anos, apurou o VALOR, na sequência da entrevista ao presidente executivo do banco, António Coutinho.

Questionado sobre a venda dos 49% das acções das AAA no SBA à empresa Inpal, conforme revelado pela agência Bloomberg e pelo VE, em Maio do ano passado, Coutinho respondeu que “o negócio ainda não estava fechado”, remetendo explicações adicionais à seguradora AAA. “Não está nada fechado. Continuamos com os nossos dois accionistas, que é o Standard Bank e as AAA. Ainda não houve uma assembleia-geral, em que se mudasse de accionistas”, argumentou o CEO do banco de origem sul-africana, afirmando, entretanto, ter conhecimento de que a seguradora estava a vender a sua participação.

Fonte autorizada das AAA assegurou, entretanto, que a seguradora já tinha alienado a sua participação a favor da Inpal Participações e que a empresa liderada por São Vicente não tinha, desde então, conhecimento do estágio em que se encontrava o processo. “Nós já vendemos a nossa parte e já recebemos os nossos valores. Se o negócio ainda não fechou, isto é com o banco e com o regulador, não tem nada que ver com as AAA”, referiu ao VE a fonte, que não avançou o valor do negócio.

Funcionários do SBA confirmam também que as AAA não têm qualquer representante ou administrador no banco há mais de um ano, mas não sabem explicar o atraso na entrada do novo accionista.

Contactada, a Inpal, o novo investidor que deve substituir as AAA na estrutura do SBA, escusou-se a fazer qualquer comentário sobre o assunto, situação que se verificou também por parte do Banco Nacional de Angola (BNA), que, até ao fecho desta edição, não reagiu à solicitação do VALOR.

Fonte próxima do regulador conhecedora do processo avançou, no entanto, que a finalização do negócio está dependente de um conjunto de documentos que o BNA terá solicitado ao Standard Bank Angola e que, até à data, não foram entregues, apesar de a instituição liderada por Valter Filipe ter notificado o banco, por volta de Agosto de 2016, sobre o despacho que autoriza a venda da participação das AAA à Inpal. Segundo apurou o VALOR, o despacho do BNA que aprova o novo investidor terá sido exarado ainda no segundo trimestre de 2016 e, poucos meses depois, o regulador terá notificado o banco a remeter os documentos que condicionam o registo dos 49% das acções a favor da Inpal, entre os quais a acta de assembleia-geral de accionistas do SBA, a mesma que, segundo António Coutinho, ainda não aconteceu.

O não recebimento da acta da assembleia-geral de accionistas do SBA será assim, segundo fonte próxima do regulador, o que condiciona o registo das accões por parte do BNA. A fonte não comentou a razão do atraso da reunião dos accionistas do SBA, mas assegurou ter conhecimento de que, além da aprovação do BNA, o novo accionista ficou aprovado no processo de ‘due dilligence’ do Standard Bank Group, entidade que terá notificado, por volta de Agosto do ano passado, as AAA e a Inpal que não terá encontrado qualquer razão que motivasse o impedimento do negócio.

O VALOR questionou várias fontes considerando a ausência da parte angolana na gestão do banco, mas não obteve respostas. Um especialista em assuntos da banca comentou apenas que “um banco, nesta situação, poderá tirar partido dos dividendos que deveriam ser atribuídos à parte angolana e não o são com certeza”. “Pode gerir o risco dos créditos aprovados, bem como os investimentos que o banco esta a fazer à sua discrição, o que, se der prejuízos, será também danoso para o accionista angolano que não teve participação no processo decisório, e, nesta fase, pode usar da mesma discrição da disponibilidade de divisas e, por exemplo, beneficiar mais estrangeiros que nacionais”, analisa, apontando que “cabe ao BNA, enquanto regulador, verificar a conformidade da situação”. A venda da participação das AAA no SBA à Inpal foi divulgada, pela primeira vez, em Maio de 2016, depois de a agência Bloomberg e o VE terem dado conta que a empresa liderada por São Vicente estava de saída do banco, alienando os 49% das acções a um novo investidor. Os detalhes contratuais da operação, incluindo os valores da transacção, não foram revelados. Mas o VALOR soube, de fonte próxima ao processo, que as AAA deram o negócio como terminado por terem recebido o total do pagamento das acções por volta de finais de 2014, e terão passado uma procuração irrevogável a favor da Inpal.

O VALOR soube, de fonte próxima ao processo, que as AAA deram o negócio como terminado por terem recebido o total do pagamento das acções por volta de finais de 2014, e terão passado uma procuração irrevogável a favor da Inpal.

CEO do Standard Bank Angola critica fortemente políticas de distribuição de divisas do BNA, que considera privilegiar um grupo de cinco bancos na gestão de 80% das divisas. O gestor abre-se ao VALOR e classifica as medidas do banco central de “jogo não claro”, admitindo um agravamento das condições económicas, caso o Governo insista na ‘lista’ das divisas.

 

A economia foi gravemente afectada com a perda dos últimos correspondentes bancários em dólares. Como o sistema bancário pode recuperar as relações com os correspondentes bancários e trazer de volta os dólares para Luanda?

O Banco Nacional de Angola (BNA) tem feito um grande trabalho no que respeita às políticas cambiais. As suas viagens na Europa e nos Estados Unidos da América revelam esta vontade de mostrar aos parceiros o que se tem feito em termos de leis e o que já foi feito para se conformar as normas internacionais, em matéria de boas práticas, e, também, pedindo conselhos. O papel do BNA é o que já tem vindo a fazer: comunicar fora do país, sendo o regulador do mercado, aquilo que se tem em termos de regulação e boas práticas de supervisão bancária, para que todos estejam no mesmo padrão. Já existem bancos a publicarem contas no sistema de controlo internacional, onde todos os bancos podem utilizar as mesmas regras, não só dentro do país, como no exterior. Sendo que as regras de apresentação dos resultados são todas em dólares, o Standard Bank Angola (SBA) pode fazer uma comparação com um banco que esteja em Hong Kong ou que esteja na Europa. Isto dá credibilidade `as contas auditadas, num padrão reconhecido internacionalmente. É muito importante controlar as transacções financeiras antes de elas saírem fora do país, acho que é isto que o BNA tem vindo a fazer. Tanto é que já existem os softwares e penso que, até 2018, todos estaremos neste padrão.

Dada a experiência internacional do SBA, que apoios concretos pode dar ao BNA?

Com a sua experiência, o SBA tem ajudado o banco central da África do Sul e de outros países onde opera. É óbvio que deve fazê-lo com o BNA. Por exemplo, muitas das cartas de créditos são abertas na África do Sul, através do Standard Bank, o que tem facilitado a aquisição dos produtos da cesta básica, para Angola…

Os apoios resumem-se às cartas de créditos?

Há outros apoios, sobretudo no que toca ao conhecimento e às boas práticas. Não se pode esquecer que o país perdeu o seu último banco correspondente em moeda estrangeira. Logo, isto reflectiu-se na importação dos produtos que tinha de ser feita em dólares, euros ou ienes. E nós conseguimos fazê-lo através da nossa ‘casa-mãe’ na África do Sul, porque continuamos a ter acesso aos mercados internacionais, e com outros bancos com os quais temos relações nos países da Europa, Ásia e América.

Acha que o curso actual da política cambial é compatível com as necessidades do momento?

O que tem faltado, a meu ver, é a transparência na alocação das divisas. Ao SBA são alocados, por exemplo, 10 milhões de dólares e, em certos casos, já nos são indicados os clientes. Há vezes em que recebemos dinheiro de clientes que não têm conta no banco, o que cria muita confusão. A outra questão está relacionada com a proporcionalidade com que se distribuem os valores: uns recebem 80% e outros ficam com 20%. Isto é injusto. Não entendo as razões que levaram à tomada desta decisão.

Como devia ser feita a distribuição das divisas?

No sector financeiro, as regras do jogo têm de ser claras e todos devemos saber como as coisas são tratadas. Este tipo de comportamento vai ter um impacto negativo [na economia], até para o estrangeiro que pretende investir no país, por não haver clareza na definição de medidas. Agora, com o processo de diversificação da economia, a coisa tornar-se-ia ainda pior, porque o país precisa de atrair investimento para o sector produtivo e, por fim, para poder exportar. Como se sabe, já temos banana de Angola a ser exportada para os países vizinhos e para os EUA, o que pode trazer um valor acrescentado à economia, mas, em tudo isto, é preciso haver um jogo claro.

O SBA faz parte dos cinco bancos que alegadamente vão gerir 80% das divisas?

É a isto que me referi. 80% das divisas vão para os cinco seleccionados dos quais não fazemos parte. Os restantes 20% é que serão distribuídos para os demais operadores. Antigamente, cada um dependia do seu ministério para a aquisição de divisas, mediante as necessidades apresentadas. Agora, tudo volta para o BNA, o que acho importante, na qualidade de regulador, evitando desta forma a dispersão de divisas. Mas a forma como está a ser feita a divisão é que não é boa, porque muitos bancos bons não fazem parte do dito ‘Top Five’ (Top Cinco). Para mim, o importante não é ter mais moeda estrangeira, quero apenas transparência.

Acha que o SBA devia fazer parte do grupo?

Acho que não deve haver nenhuma lista. As alocações deviam ser feitas com base nas necessidades dos clientes e das políticas do Estado. Se a prioridade for para a aquisição da cesta básica, todos os nossos clientes que importam estes bens terão benefício. Não é justo beneficiar cinco bancos, deixando 25 de fora ou dar-lhes apenas 20% do total das divisas. Isto pode fazer com que muitos operadores deixem de funcionar e passem as contas todas aos cinco.

O BNA é a única fonte de divisa do SBA ou recebe apoios da casa-mãe, na África dos Sul?

Se puder [a casa-mãe], manda, mas para o capital do banco e não para operações de mercado. Nós dependemos do BNA, para as operações de transacção.

Teve algum impacto a saída dos correspondentes em dólar para o SBA?

Não. Mas pode ser [que tenha] em termos de resultados na disponibilidade dos cambiais, mas continuamos a fazer as nossas operações em moeda estrangeira normalmente, porque conseguimos receber e transferir. Há problemas é na alocação das divisas [pelo BNA]. O BNA é que faz esta alocação aos bancos e, estes, por sua vez, transferem para fora. No caso de o BNA não ter divisas, não conseguimos efectuar transferências.

Além da crise de divisas, há uma efectiva crise económica e financeira no país. Em que medida esta conjuntura impactou nas operações do banco em 2016?

O ano passado foi um ano favorável, pelo que temos vindo a fazer, embora seja verdade que o momento que o país tem estado a passar, desde a redução do preço do petróleo, tem impactado nas nossas operações.

O banco tomou medidas de contenção para contornar a crise?

Tivemos de fazer alguns reajustes, sendo um banco novo no mercado. Tivemos de fazer uma redução de custos, não só com o pessoal, até porque registamos uma subida à volta dos 30% a 26% em custos de operações, no sentido de nos conformarmos ao índice de inflação que chegou aos 42%.

E qual foi o impacto dessas medidas nos resultados?

Em 2016, tivemos resultados mais elevados da nossa história, passados sete anos da nossa presença em Angola, fixando-se em 50%. Até parece um pouco exagerado, mas não é o caso, porque tem tudo a ver com o crescimento dos depósitos, dos clientes, que registaram um aumento na ordem dos 22%, face ao ano anterior. Este crescimento foi impulsionado maioritariamente pelos depósitos à ordem, no segmento empresas, com um montante de 57,4 mil milhões de kwanzas. Quanto à evolução dos depósitos, em 2016, registámos um incremento de 23%, resultante de clientes empresas, o que representa 58% do total dos depósitos do banco a retalho. Entretanto, tivemos uma inversão nos particulares, mantendo níveis superiores em relação ao verificado em 2014.

Já há uma presença considerável do retalho nas operações do SBA?

O número de clientes activos do banco sofreu um decréscimo face ao ano anterior, porém, foi compensado pelo aumento do envolvimento bancário dos clientes existentes, sobretudo empresas, concretamente as petrolíferas e prestadoras de serviços. Falo das pequenas e medias empresas, por um lado. Por outro lado, é porque muitos clientes investiram em depósitos, precavendo-se da actual situação do mercado, conjugado ao facto de sermos um banco forte em África, presente em mais de nove países, associado também com a nossa marca, que nos ajudaram a atingir os 30.635 clientes.

E os lucros?

O resultado líquido do SBA fixou-se em 7,9 mil milhões de kwanzas, um crescimento na ordem dos 50% relativamente ao registado no exercício de 2015, em que registou 5,2 mil milhões de kwanzas.

Este balanço é o terceiro, em sete anos, que fecha positivo. O que representa para os accionistas?

É um bom indicador, mas importa referir que tudo resulta de uma boa estratégia de investimento, sobretudo por ser um mercado com muita competitividade. Mas, neste momento, temos um grau de solvabilidade extremamente alto e que ultrapassa a média dos níveis recomendados pelo BNA, calculados em cerca de 10% contra os mais de 30% alcançados no ano passado.

Os indicadores reflectem altos níveis de liquidez…

Sim, porque muitas empresas têm excesso de liquidez em kwanzas. Não havendo moeda estrangeira, a disponibilidade em kwanzas é utilizada dentro do país. O que faz com que se pague o crédito com facilidade, apesar de a nossa carteira descer consideravelmente. Mas acredito que, no próximo ano, as coisas tenderão para melhor. Porque pensamos apostar nos investimentos direccionados para o interior, no sentido de desconcentrar a área de actuação. Vamos dirigir o crédito sobretudo para o sector produtivo. Temos de apostar no sector da transformação, agricultura e do crédito, porque temos muito dinheiro disponível, mas também é preciso haver bons projectos. Aqui consiste a maior dificuldade.

Esta acção implicaria investir mais estruturas do banco. Prevê abrir novas agências?

Não. O actual momento económico aconselha que apostemos mais em produtos electrónicos, em termos de transacções. Em relação ao crédito, Luanda continua a ser o mais importante, mas fora da capital vão surgir muitas oportunidades.

Em que estruturas electrónicas prevê investir?

No sector informático. Pensamos que a banca se vai ajustando às novas tecnologias, fugindo do tradicional atendimento, o uso de dinheiro físico e operações de transferências efectuadas via electrónica. Hoje, podemos fazer tudo e mais alguma coisa com o banco, sem necessidade de ir ao balcão. Isto não significa que a nota deixe de ter o seu valor nas transacções, mas tem perdido em relação à utilização que se está a dar às novas tecnologias, até porque tem mais segurança.

Em que níveis anda a carteira de crédito?

O SBA registou uma desaceleração de 5,9 mil milhões de kwanzas. Na distribuição da carteira de crédito, por segmento de clientes, o banco alocou 75% do montante a particulares e 25% ficaram com as empresas, o que resultou num crescimento na ordem dos 6%, no descoberto, em relação ao período homólogo, contra os 3% no leasing e 2% no crédito habitação.

Que segmento de empresas recolheu maior parte do crédito?

Acho ser o sector das micro, pequenas e médias empresas, onde temos vários produtos, com realce para o sector das pescas, indústria de transformação, temos também uma ligeira carteira de individuais, sobretudo para colaboradores de empresas.

Que efeitos gerou a desaceleração no crédito?

O abrandamento registado na concessão de crédito teve impacto no rácio de transformação em 2016, fixando-se em 21%, menos 12 pontos percentuais face ao período homólogo anterior (2015) em análise cujas taxas se fixaram em 33%. Quanto ao reembolso, o segmento empresas obteve 42%, o que reflecte a aposta. Porém, a qualidade de crédito, por imparidade, concedido apresentou uma queda de 2%, passando de 51,4 mil milhões de kwanzas, para 50,2 mil milhões, incidindo numa diminuição da carteira de crédito calculada em 4,3 pontos percentuais, o que reflecte um aumento nas operações em divisas, passando de 35,5% para 39,8%. Tivemos de adoptar medidas internas de aceitação de crédito, relativamente ao nível de análise de risco e das garantias recebidas, porque o ambiente por si só propicia o grau de incumprimentos. Mas conseguimos manter os níveis aceitáveis, em que a taxa de incumprimento registou um aumento de 1,9 mil milhões de kwanzas, cerca de 4,6% da carteira total de crédito, contra os 1,1 mil milhões de kwanzas, alcançados em 2015 o que representa cerca de 2,5%.

E o malparado?

O malparado resulta do ambiente que o país vive, que tem resultado em redução de muitos trabalhadores, mas tivemos medidas cautelares que fizeram com que o crédito malparado não disparasse para níveis muito altos. O banco tem uma responsabilidade social e achamos que não devemos entalar o cliente. Temos de garantir ao cliente que o crédito deve ser feito de forma responsável, para se evitar a situação de incumprimento que pode incidir em hipotecas e colocar a sua família em péssimas condições de vida.

Olhando para a situação económica, a ‘medida cautelar’ com o crédito é para durar?

Acredito que as coisas vão melhorar, porque os ciclos não duram para sempre. E acredito que já estamos a passar pela parte negativa. Acho que a parte positiva vem a seguir. Mas isto não tem só a ver com o preço do petróleo, mas com as medidas que o país e o Estado vierem a tomar no que respeita à redução de custos, controlo da inflação, diversificação da economia e aumento do investimento em infra-estruturas. É importante perceber que o sector eléctrico tem grande impacto nos custos de operação no país, o que encarece o produto final, devido às despesas com os combustíveis e geradores que são obrigados a trabalhar 24 horas ao dia. Isto também tem impacto na moeda estrangeira e cria poupanças para a economia.

Com um nível actual de desvalorização do kwanza e o índice de inflação a furar os 40%, que reformas acha que devem ser tomadas para a estabilidade monetária nacional?

A desvalorização da moeda, para um país como Angola, que depende em grande medida de um único recurso, que é o petróleo, daria mais benefícios para o Estado do que para o cidadão, porque o Governo paga os salários em kwanzas. Mas é preciso saber que muitos investimentos do Estado são feitos em moeda estrangeira. O que acontece, na verdade, com a desvalorização da moeda é que os custos do Estado reduzem. No caso, precisaria de menos divisas para vender, ou seja, o seu custo em salários com a moeda estrangeira desce, isto seria um dos benefícios. Para a população, no caso, o preço de importação sobe, o que criaria um impacto negativo na balança de aquisição do cidadão, porque os preços vão disparar em kwanzas o que obrigaria a subida do salário dos funcionários, e, não sendo, provocaria um impacto negativo no poder de compra sobretudo da cesta básica. Eu acho que a medida de não desvalorizar a moeda é boa.

Que outras medidas podem ajudar na estabilidade dos preços?

O Estado deve é reduzir o custo de produção do petróleo porque, se vender o barril a 50 dólares, o custo de produção deve descer para além dos 40 para duplicar as receitas. A redução da inflação nos últimos dias reduziu de 42 para 36 e acredito que vai continuar à descer devido a queda que se tem registado no câmbio, mas pode não atingir os níveis previstos.

Se se prolongar o actual quadro económico, já se pode falar em fusões e aquisições?

Claro que isto vai acontecer, sobretudo para os bancos mais pequenos. Isto é se não se melhorar o ambiente do mercado. A fusão resulta no corte de custo e uma capacidade maior em termos de compra de moeda estrangeira, mas também por ser uma das formas de resolver a liquidez dos próprios bancos. A banca angolana é muito atractiva, mas também existem aqueles que não têm lucros e, se existir esta possibilidade, é uma importante fase.

O SBA estaria disposto a negociar uma fusão na banca nacional?

Se for um banco com interesse, estaríamos abertos em negociar, porque não podemos fazê-lo por fazer. É preciso que haja benefícios para os nossos clientes, os accionistas e o próprio Estado. Ou seja, todos os intervenientes devem sair a ganhar.

O VALOR sabe, através de informação já divulgada, da venda da participação dos 49% das AAA a um novo investidor. Este processo já está fechado?

Não está nada fechado. Continuamos com os nossos dois accionistas, que são o Standard Bank e as AAA. Ainda não houve uma assembleia-geral, em que se mudasse de accionistas.

Isto quer dizer que o negócio com outro comprador não fechou?

Isso vocês têm de falar com as AAA. O que eu sei é que os AAA estão a vender.

O que representaria para SBA a entrada do novo accionista?

Continua-se a operar normalmente. Temos a nossa reunião de accionistas, temos o nosso conselho de administração, o banco opera bem, temos a nossa ligação estrangeira, com a nossa ‘empresa-mãe’ e temos um resultado bom. O nosso resultado, nas nossas demonstrações financeiras, fala sobre o desempenho do banco. Não há problema. Se os accionistas um dia mudarem, se acontecer (não se pode especular), o banco continua a operar. O banco tem os seus padrões, tem as suas regras, é uma instituição sólida, tem as suas políticas, e não é o acionista que vai ter impacto naquilo.

O grupo SBA foi acusado recentemente, na África do Sul, de participar de um esquema de manipulação cambial, com o risco de ser condenado a altas multas. Como se defende o banco?

O caso está em curso no tribunal, mas posso assegurar que é uma acusação falsa. Ainda não foi ultrapassada, mas o Standard Bank não aceita aquela acusação. O sector bancário é complexo e muito exigente e cumprimos com as regras estabelecidas internacionalmente, para garantir que as boas práticas são devidamente observadas. Temos contratado peritos para investigar o caso, enquanto isso o Standard vai defender-se.

 

 

PERFIL

António Coutinho é um contabilista de formação, de nacionalidade moçambicana. Dono de uma carreira de cerca de 20 anos, já exerceu, entre várias actividades, funções de auditor sénior na Deloitte & Touche e de director financeiro do Grupo Manica Limited, em Moçambique, além do cargo de presidente da Interbancos. O vínculo com o grupo Standard Bank inicia em 2004, no posto de administrador, responsável pelo pelouro das finanças e de informática. Já no banco, é promovido a administrador-delegado, função que desempenhou até 2015, altura em que chega a Luanda para a condução dos destinos da sucursal do banco em Angola, onde continua até à data.