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O analista de risco político Klisman Murati, da consultora Global Risk Insights, prevê que Angola pague as suas dívidas, mas considerou que os investidores estão “a suar” devido às dificuldades económicas e financeiras do país.

“Angola passou por uma turbulência política e económica, revelando várias linhas vermelhas que preocupam os investidores”, escreveu o analista, numa nota publicada no site desta consultora especializada no risco que os países apresentam para os investidores e instituições económicas internacionais, e que conclui que Angola deve honrar os compromissos financeiros.

Na análise, Klisman Murati argumenta que “juntando a mudança, especialmente a mudança política - que é algo a que Angola não está habituada -, juntamente com baixas receitas petrolíferas, uma forte depreciação da moeda e uma crescente agitação pública devido a suspeita de eleições manipuladas, não é de admirar que os detentores da dívida pública em moeda estrangeira estejam “a suar”.

Angola deve atingir as metas para a inflação e para as taxas de câmbio este ano, “mas as dificuldades económicas podem levar a que o Fundo Monetário Internacional ofereça um pacote de resgate financeiro, que o Governo provavelmente vai recusar, uma vez que a actual liderança está a apostar num orçamento de 44 mil milhões de dólares, baseado no crescimento económico de 2,1% com um défice orçamental de 5,8%”. Como o orçamento prevê o petróleo a 46 dólares por barril este ano, “as receitas do petróleo devem subir devido ao aumento do preço e da produção, resultando em confiança de que o Governo vai pagar aos detentores de dívida em moeda estrangeira”, conclui o analista.

O risco político de Angola, considera, está a aumentar, e os cinco principais factores a ter em conta são as receitas do petróleo, o rácio entre as obrigações de pagamento de juro e as receitas das exportações, a depreciação da moeda e a inflação, os empréstimos do Banco Mundial e a vontade política.

Em 2015 as receitas geradas pelas exportações de petróleo tinham caído 44,5%, para 33,4 mil milhões de dólares, face ao ano anterior, o analista sublinha que “o défice, que vai chegar a 6,8% do PIB face à previsão inicial de 5,5%, vai ser financiado essencialmente à custa do endividamento interno”.

Sobre o rácio entre os pagamentos dos juros da dívida e as receitas das exportações, Klinsman Murati escreve que os investidores devem ter em conta que os preços do petróleo, que vale 97% das exportações, estão em baixa, “o que vai ter um impacto enorme nas contas do Governo”, que já tem uma dívida que está perto dos 50 mil milhões de dólares.

Angola, acrescenta, enfrenta a inflação mais alta dos países do sul de África, com mais de 35% em julho do ano passado, dez pontos percentuais mais alto que a subida do custo do dinheiro no Malawi, Zâmbia e Moçambique, e sofreu também uma desvalorização cambial de 40% face ao dólar.

O Banco Mundial, diz, fornece empréstimos “a países com problemas de pobreza, por isso novos empréstimos em moeda estrangeira podem indicar que Angola vai pagar as dívidas”, mas, acrescenta, “um ponto importante é que a parceria estratégica para o ano fiscal de 2014 a 2016 está a chegar ao fim, no seguimento de um empréstimo de 650 milhões a Angola”.

O analista diz que os investidores estarão particularmente atentos à mudança política, já que o histórico Presidente já anunciou que não se vai recandidatar: “Perceber que tipo de liderança e quais as novas prioridades será fundamental”.

Estamos de volta, esta semana, aos receios instalados no sistema financeiro sobre a possibilidade de novas mexidas no Banco Nacional de Angola (BNA) e sobre os potenciais conflitos éticos deriváveis desse processo. Mas passemos antes pelas nomeações e exonerações no Banco de Poupança e Crédito (PBC), pelos rumores associados e pelos comunicados atribulados. Como se sabe, os accionistas do BPC (o Estado mais duas instituições do Estado) decidiram pela interrupção do mandato da administração de Cristina Van-Dúnem (PCA não-executiva) e Zinho Baptista (PCE). A decisão surpreendeu por surgir menos de seis meses, após a nomeação, pelo Presidente da República, da administração agora afastada. Em circunstâncias normais, considerada a estranheza do caso, os accionistas teriam, no mínimo, a obrigação de explicar as razões de uma decisão tão inédita quanto drástica. Afastar um conselho de administração do banco mais sensível do sistema financeiro, em menos de seis meses de mandato, num contexto que demanda por estabilidade, impõe uma justificação aceitável. Os accionistas não o fizeram. O Ministério das Finanças, com a responsabilidade singular enquanto accionista qualificado em representação do Estado, entendeu que não devia fazê-lo. Optou apenas por autorizar a publicação de um comunicado, pelo BPC, que insinua que a gestão de Cristina Van-Dúnem e Zinho Baptista foi dispensada por incompetência. É o que se depreende da leitura de um dos pontos do comunicado ao apontar que “os accionistas acreditam que estão criadas as condições para devolver ao BPC a sua reputação e rentabilidade nos próximos exercícios”. Isto não significa outra senão que, antes – leia-se ao tempo da gestão exonerada –, essas “condições” não estavam criadas. Acontece que essa sugestão soube a muito pouco, já que se colocou em substituição de uma explicação que se exigia convincente. E é precisamente por isso que os rumores subsequentes, que o Ministério das Finanças foi obrigado a desmentir, ganharam força. Os rumores, além de colocarem em xeque a idoneidade de alguns membros da nova administração do BPC, foram ao ponto de referir um alegado plano que envolvia altas figuras do Estado, cujo fim último era o controlo das parcas divisas sob os cuidados do Banco Nacional de Angola. Entre as figuras mencionadas constavam o ministro das Finanças e o recém-nomeado PCA e CEO do BPC.

Tudo isso numa altura em que se dá como certa a saída de Valter Filipe do BNA, a quatro anos do fim do seu mandato e apesar do trabalho que realiza à frente da instituição reguladora. Sobre a confirmação dessa possibilidade, aliás, só resta uma leitura sóbria e angustiante e que ironiza a verdadeira face dos jogos do poder que espezinham os interesses do Estado. Confirmando-se o seu afastamento, Valter Filipe acabaria, paradoxalmente, por ser vítima da única virtude por que deveria ser defendido: a virtude de estar a fazer um bom trabalho.

O problema é que o bom trabalho, no contexto angolano, na maioria das vezes, implica desfazer ‘direitos adquiridos’ de grupos que penalizam gravemente a maioria. Que afundam penosamente todo um país.

Os dados adicionais que trazemos esta semana falam por si. Com um cenário de várias probabilidades que reintroduzem o tema dos limites éticos na relação entre regulador e operadores, entre banco central e bancos comerciais, o VALOR relança o debate.

A economia chinesa ultrapassou outro susto. Isto, é claro, está muito em desacordo com a sabedoria convencional ocidental, que há muito esperava uma ‘aterragem dura’ na China. Mais uma vez, a perspectiva ocidental perdeu o contexto chinês - um sistema resiliente que aposta muito na estabilidade.

O primeiro-ministro Li Keqiang explicou tudo isso no recente Fórum de Desenvolvimento da China. Assisti a este fórum durante 17 anos consecutivos e aprendi a ler nas entrelinhas. Na maioria das vezes, altos líderes chineses fazem declarações bastante aborrecidas sobre realizações, alvos e reformas, seguindo a linha oficial do relatório de trabalho anual ‘sobre a economia que é entregue ao Congresso Nacional do Povo’ duas semanas antes.

Este ano foi diferente. Inicialmente, Li Keqiang parece ter ficado subjugado às perguntas de uma plateia de iluminados que se concentravam em questões de peso como fricções comerciais, globalização, digitalização e automação. Mas ganhou vida no encerramento, emitindo uma declaração não solicitada sobre a força subjacente da economia chinesa: “Não haverá uma aterragem dura”, asseverou.

É um sinal claro de Li Keqiang esté em sintonia com os dados oficiais dos primeiros dois meses de 2017: força sólida no comércio, na produção industrial, no consumo de electricidade, na produção de aço, no investimento fixo e nos serviços (assinalado por um novo Indicador mensal da Agência Nacional das Estatísticas da China). Enquanto isso, as reservas cambiais recuperaram em Fevereiro, pela primeira vez em oito meses, apontando para uma diminuição das saídas de capital.

Ao mesmo tempo, o Banco Popular da China (BPC) tomou o rumo da Reserva Federal dos EUA neste mês e impulsionou o aumento das taxas em cerca de dez pontos. O BPC não teria tomado esse passo se tivesse estado excessivamente preocupado com o estado da economia chinesa.

Mas a ‘cereja no topo do bolo’ veio dos dados de comércio: o crescimento anual das exportações de 4% em Janeiro e Fevereiro, seguindo uma contracção de 5.2% no quarto trimestre de 2016. Isto sublinha um contraste entre o último e os anteriores números de crescimento .

Chame-se o efeito Trump: o renascimento dos ‘espíritos animais’ da economia global nos últimos meses tem proporcionado um alívio importante para uma economia chinesa que ainda depende muito das exportações. Enquanto as crises de crescimento anteriores foram exacerbadas por pressões crónicas para baixo, a partir da procura global pós-crise, desta vez, houve ventos de feição externos.

Mas, enquanto o prognóstico de curto prazo para a economia chinesa é muito mais animador do que a maioria esperava, uma estranha sensação de negação, que faz fronteira com a arrogância, parece estar a minar o pensamento estratégico da China. Com os EUA a olhar para dentro, os chineses ponderam ter a oportunidade que pode surgir de uma mudança sísmica na liderança global.

Fui repetidamente perguntado sobre a possibilidade de uma globalização centrada na China - reforçada pela liderança chinesa no comércio multilateral (RCEP), investimento pan-regional (iniciativa ‘One Belt, One Road’) e uma nova arquitectura institucional (o Banco de Investimento de Infra-Estrutura Asiático, dominado pelos chineses, e o Novo Banco de Desenvolvimento). É como se a China se estivesse a preparar para preencher o vazio deixado por Donald Trump, com o seu ‘America first’.

Os chineses são estudantes interessados em história. Sabem que as mudanças na liderança global e no poder económico são glaciais, não abruptas. No entanto, tenho a sensação de que vêem as circunstâncias actuais sob uma luz muito diferente: Trump, o grande disruptor, mudou as regras de engajamento para o que há muito tempo era uma globalização centrada nos EUA. Muitos na China perguntam-se se isso pode ser uma oportunidade para aproveitar tomar as rédeas do poder global.

Tudo é possível - especialmente num mundo onde a incerteza é a única certeza. Mas há uma outra lição da história que os chineses devem ter em mente. Como o historiador de Yale Paul Kennedy defende, a ascensão e queda de grandes potências invariavelmente ocorre sob condições de ‘superação geoestratégica’ - quando a projecção de poder global de um Estado é minada pela fraqueza dos seus fundamentos económicos domésticos. A liderança global começa com força em casa e a China ainda enfrenta um longo caminho de reequilíbrio e reestruturação antes que atinja a ‘Terra Prometida’ do que a sua liderança chama de ‘novo normal’.

Mas há outra importante desconexão entre a visão dentro da China e as percepções no Ocidente. A visão de fora é que as reformas chinesas, os meios de reequilíbrio, estancaram nos últimos cinco anos sob a liderança do presidente Xi Jinping. A mesma visão prevaleceu sob a liderança anterior de dez anos de Hu Jintao. Mas esta é realmente a maneira correcta de avaliar o que está a acontecer na China?

Os resultados importam mais do que os grandes discursos. Desde 2007, quando o ex-primeiro-ministro Wen Jiabao estabeleceu o desafio de reequilíbrio para uma economia chinesa que se tornou “instável, desequilibrada, descoordenada e insustentável”, a estrutura económica da China sofreu uma transformação dramática. O PIB do chamado sector secundário (indústria transformadora e construção) desceu de 47% em 2007 para 40% em 2016, enquanto a do sector terciário (serviços) aumentou de 43% para cerca de 52%. Deslocamentos estruturais desta magnitude são um grande negócio. A China está a fazer realmente um progresso rápido na estrada do reequilíbrio.

Tudo isso nos traz de volta a perguntas levantadas no Fórum de Desenvolvimento da China. A combinação de resiliência de curto prazo e de uns EUA a olhar para dentro parece oferecer uma oportunidade tentadora à China. Mas a China deve resistir às tentações da projecção de poder global e ficar focada na execução de sua estratégia doméstica. O desafio agora é perceber a tremenda oportunidade que Li Kepinag promoveu ao descartar uma ‘aterragem dura’.

STEPHEN S. ROACH - Economista - Professor da Universidade de Yale, EUA - Ex-presidente da Morgan Stanley Asia