Evaristo  Mulaza

Evaristo Mulaza

Não é apenas pelo níveis de degradação social. Também não é só pelos indicadores da desgraça económica. Pela natureza dos temas e pela qualidade dos conteúdos que são colocados em debate no espaço público também se mede o atraso ou o progresso de uma sociedade. Perceber onde nos encontramos com base neste quesito é tarefa fácil. Diga-se, aliás, em boa verdade, que o que se discute no espaço público é sempre fortemente condicionado ao país e à sociedade que se tem.

Embora tardia, não é uma notícia má. Pelo contrário. O Presidente João Lourenço finalmente deu a entender que está em fase avançada na curva de aprendizagem sobre o reconhecimento da fome. Melhor dito, sobre a existência da fome em Angola. Foi um processo longo e doloroso. Demorou o tempo de um mandato e, com isso, mais do que tempo, perderam-se e perdem-se vidas. Em 2019, João Lourenço não sabia que existia fome no país em que é governante pelo menos desde os 29 anos (hoje tem 70). Disse-o à portuguesa RTP. Dois anos depois, em 2021, perspectivou a fome como sendo relativa. Afirmou-o aos militantes do seu partido num comício. Agora, em 2024, foi comprometer-se, no Brasil, a erradicar a fome até 2030.

Se alguém precisava de mais uma prova, aí está. Há homens eternamente estúpidos, mas não há povos perpetuamente amordaçados. Quando o tempo chega, a corda rebenta até para o lado pretensamente mais forte. É sempre assim. É incontornável. Mesmo nos regimes mais autoritários, haverá sempre o primeiro dia de todos os outros em que a história começará a ser reescrita. 

Quando João Lourenço chegou ao poder em 2017, Angola tinha saído da lista cinzenta do Grupo da Acção Financeira (GAFI) um ano antes. Pelo que se conhece do trabalho de monitoramento das transacções financeiras internacionais pelo GAFI, a nota positiva de 2016 não foi obra do acaso. Pelo contrário, na altura, o próprio GAFI fez questão de explicar os avanços que tinham justificado o seu novo entendimento em relação a Angola. Grosso modo, eram os progressos assinalados no sistema financeiro, como resumiu certa vez José de Lima Massano, actual ministro de Estado para a Coordenação Económica.