ZUNGUEIRA
Evaristo  Mulaza

Evaristo Mulaza

Duas especulações sobre alegadas pretensões de João Lourenço têm minado a estabilidade social e política e a previsibilidade económica ao longo deste seu segundo mandato. As duas radicam em evidências irrefutáveis de que o Presidente tem medo de abandonar o poder, depois dos seus desastrados 10 anos de desgoverno. 

Antes de mais, uma confissão de desinteresse. Ouvir o Presidente João Lourenço, na maioria esmagadora dos casos, é brutalmente maçante. Chega a aproximar-se de um atentado contra a sanidade de qualquer ser razoavelmente consciente. É seguro pensar, aliás, que somos uma gota no oceano entre os angolanos invariavelmente tomados por uma espécie de angústia depressiva sempre que o Presidente fala.

Isto não é uma opinião de jornal baseada em percepções e palpites. São estudos de reputadas instituições que insistentemente desmascaram com factos e números a farsa desta governação. Há duas semanas, o economista chefe do Banco de Desenvolvimento Africano (BAD) citou dados das Nações Unidas que espelham a pilhagem do país nos dias que correm. Joel Daniel Muzima precisou que pelo menos 1,2 mil milhões de dólares saem de Angola todos os anos de forma ilícita.

O Valor Económico foi o primeiro órgão de comunicação social de referência que avançou a notícia. Em Julho de 2024, este jornal antecipou detalhes do que será o ‘Manifesto Social’ da candidatura de Higino Carneiro à presidência do partido no poder. No essencial, o manifesto destacava uma agenda de consenso para “mudar Angola”. O diálogo inclusivo, a atenção especial aos cuidados primários de saúde, o investimento significativo numa educação de qualidade, o acesso à habitação condigna, o investimento no saneamento básico e a protecção dos grupos vulneráveis sobressaíam na agenda. Sete meses depois, em Fevereiro deste ano, o Valor Económico voltou a revelar pormenores de algumas das propostas fundamentais do agora pré-candidato à liderança do MPLA. A revisão da Constituição e a mobilização de recursos para o sector produtivo saltavam à vista. Outra proposta destacável era a redução da pobreza extrema e a reestruturação do Estado, com os olhos na redução da máquina pública e no corte dos gastos que esta actualmente exige. 

Caro Lionel Messi, não temos nenhuma garantia de que, por algum meio, venha a ter contacto com este abaixo-assinado. Fazemo-lo, de qualquer forma e antes de mais, por inconformismo. É que, apesar de toda a insanidade que devassa e anestesia Angola e o mundo, acreditamos que nos resta alguma humanidade. Escrevê-lo também por ossos do ofício. É isso o que, em parte, nos permite reiterar a convicção de que continuamos a acreditar inabalavelmente nos valores e na importância do jornalismo. Escrevemo-lo ainda porque, reformulando a icónica sentença de Tolstoi, julgamos que o tempo e as nossas capacidades ainda nos permitem passar aquilo que tencionamos transmitir, mesmo que de forma parcial. Finalmente, porque, mesmo conscientes de que há uma possibilidade de 99,9% de não vir a saber deste texto, restará uma hipótese de 0,1% de ter contacto com este texto e de lhe fazer justiça.