CONSTRUÇÃO CIVIL. Construtora começou o ano mandando para casa mais de 100 trabalhadores. Grupo poderá dispensar 260, devendo deixar os estaleiros da empresa, no Kwanza-Norte, antes do fim do primeiro semestre. Uma lista dos recursos humanos e vários documentos atestam que o processo é para continuar. Indeminizações estão garantidas.
A Odebrecht despediu, entre finais de Fevereiro e início de Março, 114 trabalhadores das obras do aproveitamento hidroeléctrico de Laúca de acordo com uma lista e termos de rescisão de contrato, elaborada pela direcção dos Recursos Humanos, na posse do VALOR.
Denominada ‘desmobilização colectiva’, a lista selecciona os despedidos por áreas de actuação, desde o oficial especializado ao soldador, um grupo que deve chegar, antes do fim do primeiro semestre deste ano, aos 260 trabalhadores.
A lista, datada de 16 de Fevereiro, sugere que o processo é para continuar, já que os 114 afastados integram apenas o primeiro grupo. A empresa justificou o despedimento com a crise financeira e a falta de recursos para a continuidade dos trabalhos, numa altura em que ainda restam três das seis turbinas programadas para a conclusão do projecto. Esta não é a primeira vez que a filial da maior construtora brasileira despede trabalhadores nas operações em Angola. Só em 2015, no segundo ano da crise económica, cerca de dois mil trabalhadores da Odebrecht já tinham perdido os postos de trabalho, nas várias regiões do país.
Desde o arranque das obras da barragem de Laúca, a 5 de Setembro de 2014, operavam no projecto de engenharia à volta de 11 mil angolanos das 18 províncias, segundo dados oficiais.
O projecto já afastou quase cinco mil trabalhadores, segundo uma fonte da empresa. A mais recente vaga de despedimentos, no entanto, contraria o decreto presidencial nº179/17 que determina que os recursos humanos e meios técnicos utilizados na construção de Laúca sejam absorvidos em novas obras similares, assim como as instalações de apoios construídas devam servir para o projecto de Caculo Cabaça. “Deve ser garantida a transferência gradual da força de trabalho contratada disponível no projecto hidroléctrico de Laúca para os futuros projectos hidroeléctricos, em função do cronograma dos mesmos”, determinou o ex-Presidente José Eduardo Santos, que assina o documento.
A Odebrecht, por sua vez, explica que “todas as acções, inclusive as mobilizações e desmobilizações de pessoal, inerentes à execução da obra, estão alinhadas com a planificação do nosso cliente”, acrescentando que devem ser a Gamek e o Ministério de Energia e Águas a explicar o futuro dos trabalhadores. “A nossa actuação está estritamente vinculada ao conjunto de normas e directrizes do empreendimento”, explicou Justino Amaro, do Gabinete de Relações Institucionais da empresa brasileira.
A primeira turbina entrou em funcionamento a 4 de Agosto do ano passado, cuja inauguração contou com José Eduardo dos Santos. De lá para cá, foram lançadas, gradualmente, outras duas, sendo que a mais recente aconteceu no fim de Fevereiro.
Os trabalhadores despedidos garantem que a construtura “tem cumprido com suas obrigações”, desde a entrega de um certificado de trabalho às indemnizações.
A um operador de máquina, a Odebrecht indemniza, por exemplo, quase 1,5 milhões de kwanzas, montante distribuído aos demais técnicos dessa área, em que se enquadram, entre outros, os operadores de bomba de concreto, o especializado de tractor esteira e o lançador.
A empresa perdeu, há muito tempo, o título de maior e um dos mais estáveis empregadores do país que ostentou durante anos. Chegou a ter cerca de 25 mil empregos entre directos e subcontratados. Em 2015, já tinha registado uma diminuição para quase metade da força de trabalho para 14.817 funcionários, 10.835 dos quais directos, e perto de quatro mil subcontratados. Desde então, a tendência de redução mantém-se.
Do papel às turbinas
Os primeiros passos de construção do projecto Laúca começaram a ser dados em 2008, com um estudo de viabilização económica sobre o projecto de engenharia, encomendado pelo Governo à Odebrecht. Mas foi apenas a 22 de Junho de 2012 que o então ministro de Estado e da Coordenação Económica, Manuel Vicente, procedeu ao lançamento da primeira pedra para o desvio do Rio Kwanza.
Dois anos depois, o ex-Presidente da República presidiu à cerimónia de desvio do rio para o início de construção do paredão (barragem), com 156 metros de altura e 1.242 metros de cumprimento. No ano passado, iniciou-se o enchimento da albufeira, um processo que durou 120 dias.
O Governo estima que, com a entrada em funcionamento das seis turbinas, a barragem, que partilha o rio Kwanza com similares de Cambambe e Capanda, deve adicionar até 2.070 megawatts (MW) a capacidade eléctrica da rede nacional.
De acordo com o programa ‘Angola Energia-2025’, prevê-se um “aumento da potência instalada de dois gigawatts para 9,9 Gigawatts”. O Governo garante que a meta é chegar aos 60% da população, com Laúca a contribuir com 2.070 megawatts.
“A Sonangol competia só com as empresas estrangeiras. Agora está a competir...