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Os funcionários da Procuradoria-Geral da República (PGR) ameaçam paralisar os trabalhos, a 10 de Julho, para protestar por melhores condições laborais, aumento salarial, promoção e reconversão de categorias, informou hoje o sindicato.

 

Em declarações à Lusa, o secretário-geral do Sindicato Nacional dos Técnicos de Justiça e Administrativos da Procuradoria-Geral da República de Angola, Elias Pinto, sublinhou que a decisão foi deliberada, no sábado (1), durante a assembleia extraordinária dos funcionários da PGR.

"A assembleia aprovou a paralisação dos trabalhos na PGR a partir do dia 10 de Julho e a mesma vai decorrer durante 15 dias úteis de trabalho", adiantou, salientando que a declaração de greve será entregue hoje (3) à direcção.

Segundo Elias Pinto, o colectivo de trabalhadores do Ministério Público aprovou a moção de greve, devido à "falta de transparência e diálogo do Procurador-Geral da República de Angola", que continua alegadamente remetido ao silêncio em face das reclamações dos funcionários.

O sindicalista recordou ainda que há mais de 15 anos que os funcionários aguardam pela transição do regime jurídico e das respectivas promoções, numa altura em que a instituição se defronta com funcionários licenciados, que, há mais de 20 anos, continuam a trabalhar no sector da limpeza.

"As razões da nossa greve são claras e o patronato sabe, de facto, das nossas preocupações, porque elas estão bem enumeradas no caderno reivindicativo, mas, infelizmente, somos colocados de lado", lamentou. O primeiro anúncio de greve no Ministério Público aconteceu em Abril, prevista inicialmente para 17 do mesmo mês, no entanto, foi suspensa no quadro das negociações com o patronato.

Na ocasião, a PGR considerou “ilegal” a greve convocada pelo sindicato de trabalhadores do Ministério Público, mas admitiu que as preocupações levantadas existem e que as soluções dependem do Governo, num posicionamento manifestado pela procuradora e directora do gabinete de intercâmbio e cooperação internacional da Procuradoria, Eduarda Rodrigues.

Por sua vez, em Abril, o Procurador-Geral da República, João Maria de Sousa, disse que estava a ser realizado um estudo, orientado pelo Governo, para se analisarem formas de se atenderem às reivindicações, sublinhando que as soluções para as mesmas não dependem daquele órgão de justiça, mas de outras instituições, como o Ministério das Finanças.

"As questões que colocadas foram levadas ao conhecimento do titular do poder executivo e nós pensamos que foram, em princípio, acolhidas, na medida em que foi orientado um estudo no sentido de se ver em que medida serão satisfeitas essas exigências", referiu João Maria de Sousa.

Os economistas preocupam-se não só em responder, de forma ponderada, a perguntas difíceis, como também em formular, eles próprios, perguntas. Por vezes, é no repensar destas perguntas que pode estar a chave para encontrar as respostas de que precisamos.

 

Consideremos o debate sobre a produtividade. Os economistas que tentam explicar a aparente desaceleração estrutural do crescimento da produtividade têm feito a seguinte pergunta: Onde está o aumento perdido? A resposta abrange preocupações com medidas, mudanças estruturais no mercado de trabalho, uma potencial escassez de oportunidades de investimento, diluição da produtividade nas inovações tecnológicas e desajustamentos de competências orientadas para a tecnologia. Mas, também pode ser útil considerar uma questão ainda mais importante: quanto crescimento de produtividade realmente é necessário, e a que custo?

Não há dúvida de que o crescimento da produtividade é desejável. É um dos principais impulsionadores do crescimento do PIB (especialmente nos países onde o crescimento da força de trabalho está a diminuir) e dos rendimentos. O forte crescimento do PIB e o aumento dos rendimentos podem apoiar assim o cumprimento das necessidades e desejos humanos fundamentais. Esta ligação é particularmente óbvia nos países em desenvolvimento, onde a expansão económica e o aumento dos rendimentos são condições prévias para a redução da pobreza e do melhoramento na saúde e na educação. Mas, a ligação entre crescimento e bem-estar individual não é menos visível nos países avançados - particularmente naqueles que estão actualmente a lutar com crescimento lento, desemprego elevado, lacunas na produção, sobreposições de dívidas, taxas de câmbio desalinhadas e rigidez estrutural.

Contudo, tal não significa que o objectivo principal dos decisores políticos deva ser mais crescimento da produtividade. Sociedades - incluindo governos e indivíduos - tratam de uma série de coisas, desde cuidados de saúde e segurança até à justiça e à liberdade. Na medida em que o crescimento da produtividade - e, por sua vez, o crescimento do PIB e da renda – avança, estes objectivos sociais, são altamente desejáveis. Existe, no entanto, uma tendência entre os economistas e os decisores políticos de enfatizar em demasia as medidas de desempenho relacionadas com o mercado, negligenciando a razão pela qual o desempenho é importante: o bem-estar humano. Os esforços para implementar um quadro mais abrangente para avaliar o desempenho económico, que reflicta as necessidades e desejos sociais, têm sido em grande parte infrutíferos.

Para determinar o crescimento da produtividade que desejamos, necessitamos de ter uma visão mais ampla, que nos permita decidir a melhor forma de alocar os recursos limitados da sociedade, especialmente os mais valiosos, os recursos humanos. E deve ser responsável pelas prioridades de uma sociedade, reveladas na forma como os seus membros utilizam os seus recursos.

As descobertas e os avanços relacionados com a saúde, por exemplo, trouxeram enormes benefícios sociais desde a II Guerra Mundial: aumento da longevidade e redução da mortalidade e morbilidade infantil, e não apenas maior produtividade e PIB. É por isso que o governo dos Estados Unidos investe tanto em investigação médica: apenas o Instituto Nacional de Saúde tem um orçamento anual de 32 Mil Milhões USD para financiar projectos de infra-estruturas e pesquisas que empregam um subconjunto do maior talento científico que o país possui. Da mesma forma, a National Science Foundation e o ramo de pesquisa científica do Departamento de Energia dos EUA, recebem um total combinado de cerca de 12 mil milhões USD por ano, que utilizam para avançar uma ampla variedade de objectivos em engenharia, eficiência energética e energia verde, e em ciências naturais e sociais.

O retorno económico sobre o investimento público é ainda mais difícil de calcular para as despesas relacionadas com segurança, onde o total dos recursos alocados para melhorá-lo e a eficácia dos mesmos, pode ser incognoscível. Mas há poucas dúvidas de que a segurança tem uma poderosa reivindicação sobre o bem-estar das pessoas e, portanto, sobre a alocação de recursos.

Nalguns casos, os desejos das pessoas podem realmente entrar em conflito com o objectivo de melhoramento da produtividade. A comunicação social, por exemplo, foi muitas vezes ridicularizada como um contributo fraco ou mesmo negativo para a produtividade. Mas a produtividade não é o foco da comunicação social. O que as pessoas valorizam nela é a relação, interacção, comunicação e a diversão que a mesma permite. Na verdade, para muitos indivíduos, particularmente nos países mais ricos, a principal prioridade não é simplesmente tornarem-se mais ricos, mas sim, viverem uma vida mais rica, e é para este último objectivo que canalizarão o seu tempo, rendimento e criatividade.

A alocação dos recursos das sociedades continuará imprecisa, mas persistente, no acompanhamento dessas mudanças. Isto é especialmente verdadeiro quando se trata de recursos humanos, mas os recursos do sector público também tendem a responder às mesmas preferências e valores a longo prazo, independentemente das imperfeições dos nossos mecanismos de escolha social.

Este tipo de evolução não é exclusivo dos países com maior rendimento. A China atingiu - ou talvez passou - o estágio durante o qual o foco na produtividade e no crescimento do PIB corresponde ao senso de bem-estar dos cidadãos comuns. Como resultado, os recursos da China são cada vez mais redistribuídos num portefólio mais equilibrado que ainda inclui o crescimento, mas agrega também a protecção ambiental, o bem-estar social, a segurança e a inovação numa ampla gama de áreas que se sobrepõem apenas em parte com a produtividade e crescimento de rendimentos. Tudo isto sugere que uma parte substancial do declínio no crescimento da produtividade pode não ser o resultado de algum problema profundo com a alocação de recursos ou alguma consequência de ciclos exógenos na inovação tecnológica sobre os quais temos pouco controlo. Em vez disso, poderá reflectir uma mudança natural nas prioridades para outras dimensões de bem-estar.

Esta mudança não é sem riscos. Sem o crescimento da produtividade, os rendimentos daqueles que se encontram no extremo inferior da distribuição, permanecerão provavelmente estagnados, agravando assim a desigualdade e, como já vimos ultimamente, comprometendo a estabilidade social e política. Diante disto, os governos devem dedicar recursos para reduzir a desigualdade, independentemente da mudança de preferências do cidadão comum.

As sociedades poderiam (temos sérias dúvidas) elevar substancialmente a produtividade e o crescimento dos rendimentos, se conseguissem redistribuir inteiramente os seus recursos nessa direcção. Mas, mesmo tendo em conta as preferências destacadas e de que a incorporação das escolhas de investimento privado e público nos tornaria individual e colectivamente “melhores”, tal seria duvidoso, na melhor das hipóteses. O mais provável é não ser simplesmente verdade.

 

Michael Spence, Prémio Nobel da economia e professor da NYU, autor do livro A próxima convergência – o futuro do crescimento económico num mundo a várias velocidades e presidente da Comissão para o Crescimento e Desenvolvimento do Fórum Economico Global. Sandile Hlatshwayo é doutorada em Economia pela Universidade da Califórnia, Berkeley e vai incorporar o Fundo Monetário Internacional

A Assembleia Nacional aprovou hoje o Projecto de Lei Orgânica sobre o Regime Jurídico dos Ex-Presidentes e ex-vice-Presidentes da República, que sofreu várias alterações à forma inicial, designadamente a retirada da designação de Presidente Emérito.

 

O diploma foi aprovado com 156 votos a favor do MPLA, o proponente, da CASA-CE, do PRS e da FNLA, 20 contra, do grupo parlamentar da UNITA, e nenhuma abstenção. As alterações começaram com a designação do diploma, que tem agora o título Lei sobre o Estatuto dos Antigos Presidentes da República de Angola, referindo no segundo artigo do primeiro capítulo que "a presente lei aplica-se não só aos antigos Presidentes como também aos antigos vice-Presidentes da República de Angola que tenham cessado funções".

Na reformulação, segundo a Lusa,  fica estabelecido que os antigos Presidentes da República de Angola vão gozar das imunidades conferidas aos deputados da Assembleia Nacional, "nos termos das disposições combinadas do número 1 do artigo 133.º e do número 3 do artigo 135.º da Constituição da República de Angola".

Na versão inicial, o projecto previa que, findo o mandato, o ex-Presidente gozaria de "foro próprio para efeitos criminais ou responsabilidade civil, por actos estranhos ao exercício das suas funções perante o Tribunal Supremo, nos termos do disposto na lei". No que se refere à pensão vitalícia dos antigos Presidentes, houve um recuo, passando agora os antigos Presidentes a beneficiar de 80% do salário base do Presidente da República em funções, enquanto anteriormente era estabelecida uma atribuição correspondente a 90% do vencimento durante o último ano do mandato.

Igualmente para os cônjuges dos antigos Presidentes da República à data do exercício das suas funções, que têm direito a uma subvenção mensal vitalícia equivalente a 60% do salário base de um ministro, ao contrário dos 70% do vencimento do Presidente da República em funções, propostos inicialmente.

A presente lei estabelece ainda que os direitos nela previstos são imediatamente suspensos, se o titular assumir a função que esteve na base da sua atribuição, bem como dá a possibilidade de os beneficiários poderem renunciar aos direitos patrimoniais previstos no diploma.

Na sua declaração de voto, a UNITA, maior partido da oposição, justificou não concordar com o carácter de urgência da lei, salientando que o país quando Angola teve um ex-Presidente, desde 1979, pelo seu falecimento, o que "dá a entender que está em causa encontrar um fato 'pret-à-porter', à medida de um homem e na sequência dar boleia ao antigo primeiro Presidente da República e seus descendentes".

Para a UNITA, há questões com as quais "não pode pactuar", apesar de reconhecer que um Presidente da República após o fim do seu mandato deve auferir direitos que dignifiquem o seu estatuto e goze de imunidades".

"Quando o país tem muitos dos seus antigos combatentes e centenas de milhares dos seus ex-militares, muitos deles mutilados de guerra, constituídos em exército de mendigos, fora da caixa de segurança social, e a Assembleia Nacional aprova uma lei que dê uma dupla subvenção às ex-primeiras damas da República", referem.

O diploma hoje aprovado esteve envolto em polémica, quando na semana passada, Irene Neto, deputada do MPLA e filha do primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto, manifestou o seu descontentamento com as regalias estabelecidas na lei.

Noutra ocasião, também Maria Eugénia Neto, viúva do falecido primeiro Presidente de Angola, contestou a figura de Presidente Emérito para os ex-chefes de Estado, questionando que título teria António Agostinho Neto.

 

 

Nos últimos 12 meses, tenho lido textos, informações, assistindo e ouvindo vários debates sobre a economia angolana. É unânime, entre os interlocutores, que o causador do cenário de crise económica e financeira que Angola está a viver é a baixa do preço de barril de petróleo a nível internacional. Parece que, para os interlocutores, apontar o petróleo como causador da crise torna mais facíl encontrar uma fórmula para a solução: é o preço do barril de petróleo subir.Ter isto como solução é como confiar na sorte, só que pode dar um grande azar. E, por outro lado, estariamos sempre a depender do petróleo até acabar. Existem paises sem petróleo e vivem super bem.

Tecnicamente, porque chegámos até aqui? Qual foi o problema central da economia angolana?

Se nós pegássemos numa máquina do tempo e regressássemos a 2002, verámos que a política económica errou na matriz (criámos um modelo económico que assenta no consumo público explosivo).

Tínhamos e temos, depois de alcançar o nosso bem maior, a paz, um problema no lado da oferta (produção interna) e pensámos que era no lado da procura, então, começámos e continuamos a fornecer subsídios e incentivos para o lado da procura (através de orçamentos expansionistas), desconsiderando o ‘supply side’ (parte da oferta interna). Tínhamos um problema de falta de oferta e o tratamos como falta de procura (como os Keynesianos advogam).

Estávamos em pleno ambiente geopolítico e económico – financeiro internacional favorável. Crescer, de forma estrutural e sustentável, exigiria ganhos de produtividade, ou seja, foco no supply side . Fizemos o contrário: na última década o sector público mais do que duplicou (tínhamos 15 ministérios em 2002 passámos para 33 em 2012, aumentámos os institutos públicos, criámos novas empresas públicas e outros novos entes públicos).

Analisando o comportamento das despesas orçamentais em percentagens do PIB, ao longo da última década, as despesas correntes (de curto prazo), foram sempre superior às despesas estruturantes (FBCF ), como podemos observar em alguns anos, as despesas de curto prazo: 2009 (29,5%), 2010 (28,6%), 2011 (30,0%), 2012 (29,0%), 2013 (28,7%) e 2014 (28,8%); As despesas de longo prazo: 2009 (12,4%), 2010 (11,4%), 2011 (10,2%), 2012 (12,3%), 2013 (12,1%) e 2014 (27,5%) , segundo o relatório do FMI (consultas de 2015 ao abrigo do artigo iv). Criámos um modelo em que o sector público é o maior cliente do sector privado, o que significa que o sector privado é um sector público camuflado. Segundo Hodges (2002), em 2002, em média, os salários de um técnico superior da função pública rondava os 150,00 USD, hoje é muito provável que esteja acima de 1.000,00 USD, sem produzir quase nada. O produto interno bruto não-petrolífero aumentou, mas, na óptica da despesa e a economia ficou balofa. Os modelos económicos que assentam em grande medida no consumo estimulam as importações.

Fornecemos mais combustível à demanda agregada, criando uma inflação que foi controlada e mascarada (a inflação saí de 105,5% em 2002 para 7,48% em 2014), pelo mecanismo de manipulação de taxa de câmbio derivada na sua maior parte das divisas provenientes da exportação de petróleo, na medida em que o preço estava acima de 100,00 USD, influenciando que as importações respondessem à procura que se criou sem produzir nada. E as políticas ultra-expansionistas da última década em Angola foram apoiadas entusiasticamente pela maior parte dos economistas Keynesianos angolanos, que hoje fingem não ter nada que ver com assunto. E a economia angolana tornou-se mais Keynesiana do que o próprio Keynes.

A nossa crise não é causada pelo petróleo, mas sim é a crise de destruição de riqueza, ou seja, de consumo explosivo, na medida em que, quanto mais aumentávamos a dimensão do sector público, retardávamos o crescimento económico e dávamos cabo da riqueza. Se analisarmos com mais detalhes a nossa crise, ela é atípica e não típica, ou seja, não deriva de um ciclo que estava superaquecido com produtividade e atingiu o ‘steady state’ (estado estacionário) e está em recessão. Esta crise é atípica porque deriva da destruição da riqueza, do consumo explosivo (em que as pessoas, para casar, mobilar a casa, para viajar, para ir de férias e outras despesas solicitavam crédito) e o sector produtivo não criou capacidade de alterar a estrutura base de exportação. Engordámos sem produzir nada.

O petróleo fez-nos viver uma vida que não era nossa, estamos na crise que sempre estivemos, porque os indicadores eram artificiais e conjunturais. Agora, o petróleo está a dizer-nos que não há almoços grátis e temos de mudar de vida. Desligou apenas o aparelho da farra, no sentido de irmos dormir porque amanhã é dia de muito trabalho. Um diagnóstico errado jamais produziria um bom prognóstico.

O problema já está identificado e a solução é fácil, o difícil é implementar por parte dos decisores. Porque consiste em desfazer a procura que criámos sem produzir nada, através de uma reforma estrutura profunda.

Reformas estruturas derivadas de políticas estruturas, que são, no essencial, políticas microeconómicas destinadas à melhoria do potencial de oferta da economia, daí o serem também designadas de políticas do lado da oferta, através da promoção da eficiência dos mercados e dos sectores de actividade, contribuindo, assim, para uma maior taxa de crescimento do produto real da economia. Basicamente, as políticas estruturas visam reduzir o peso do sector público na economia, transformar os menos produtivos em mais produtivos, combater os salários ineficientes e investir, de forma racional e sofisticada, nas despesas estruturantes dos sectores estratégicos para se ter expectativa de crescimento económico de médio e longo prazos.

Por outro lado, é fundamental a liberdade económica: enquanto o único remédio que torna os angolanos capazes de explorar o máxímo o seu potencial ou talento. Sem liberdade económica não haverá crescimento económico sustentável. Penso que este é um dos elementos que nos faz não responder às exigências da globalização económica. Também a inserção global da economia angolana passa por soluções de entraves económicos, relativamente à abertura ao resto do mundo.

Entretanto, é sabido que a agenda de reforma estrutural, através de uma agenda de economia liberal, é difícil, mas necessária. Porque o que a crise nos questiona é o quanto estamos dispostos a sofrer para amanhã prosperarmos.

O remédio não é a vitamina doce, é amargo, mas o doente sobrevive. E estamos a atrasar a aplicar tais medidas. Isto significa que a altura da queda está a aumentar e a dor será maior.

Neste momento, se houver uma recuperação do preço do barril de petróleo, estaríamos apenas a adiar o problema, porque o Kuduro de aumentar a dimensão do sector público continuaria. Penso que devemos enfrentar o mais rapidamente possível uma agenda profunda de reforma estrutural, se não a crise continuará a enfrentar aquilo que os brasileiro dizem “a gente”. Economista e Professor de Macroeconomia Estruturalista

26 Jun. 2017

Inversão do Brexit?

A realidade económica está a começar a contrariar as falsas esperanças de muitos britânicos. Há um ano, quando uma mínima maioria votou na saída do Reino Unido da União Europeia, acreditaram nas promessas da imprensa popular e dos políticos que apoiaram a campanha Leave, que o Brexit não iria reduzir os seus padrões de vida. Em boa verdade, no ano transacto, conseguiram manter esses mesmos padrões, aumentou porém, o endividamento das famílias.

Isto funcionou durante algum tempo, pois o aumento no consumo doméstico estimulou a economia. Mas o momento da verdade para a economia do Reino Unido está a aproximar-se rapidamente. Como demonstram os últimos números publicados pelo Banco da Inglaterra (BoE), onde o crescimento salarial na Grã-Bretanha não está a acompanhar a inflação e os rendimentos reais começaram a cair. À medida que esta tendência continuar nos próximos meses, as famílias logo irão perceber que os seus padrões de vida estão a descer, e terão que ajustar os seus hábitos de consumo. Para piorar as coisas, também perceberão que se tornaram excessivamente endividados e terão de desacelerar, reduzindo assim ainda mais o consumo doméstico que tem sustentado a economia.

Além disso, o BoE cometeu o mesmo erro que o agregado familiar médio: subestimou o impacto da inflação, que agora está a tentar ser recuperado, aumentando as taxas de juros de forma pró-cíclica. Estas taxas mais elevadas tornarão o endividamento das famílias ainda mais difícil de ser pago. Os britânicos estão a aproximar-se rapidamente do ponto de inflexão que caracteriza todas as tendências económicas insustentáveis. Refiro-me a um ponto de inflexão como “reflexividade” - quando tanto a causa como o efeito se moldam. A realidade económica é reforçada pela realidade política. O facto é que o Brexit é uma proposta lose-lose, prejudicial tanto para a Grã-Bretanha como para a UE. O referendo do Brexit não pode ser desfeito, mas as pessoas podem mudar de opinião.

E aparentemente, isso está já a acontecer. A tentativa da primeira-ministra Theresa May de fortalecer a sua posição de negociação, ao realizar uma rápida eleição, fracassou redondamente, perdendo a maioria parlamentar e dando origem a um parlamento suspenso (nenhum partido tem a maioria).

A principal causa da derrota de May foi o erro fatal de propor que os pensionistas pagassem, com os seus próprios recursos, uma parcela substancial da sua assistência social, o correspondente, de forma genérica, ao valor das casas onde viveram durante toda a vida. Este “imposto da demência”, como se tornou amplamente conhecido, ofendeu profundamente o núcleo central do eleitorado do Partido Conservador de May, os idosos. Muitos não votaram, ou apoiaram outros partidos.

O aumento da participação dos jovens também foi um factor importante que contribuiu para a derrota de May. Muitos deles votaram nos Trabalhistas como forma de protesto, não porque quisessem filiar-se num sindicato ou porque apoiassem o líder trabalhista Jeremy Corbyn (embora este tenha tido um desempenho inesperadamente impressionante ao longo da campanha).

A atitude dos jovens da Grã-Bretanha no mercado único é diametralmente oposta à de May e dos apoiantes de um Brexit “difícil”. Os jovens estão ansiosos por empregos bem remunerados, seja na Grã-Bretanha ou noutros lugares da Europa. Neste aspecto, os seus interesses correspondem aos da cidade de Londres, onde alguns desses empregos se encontram. Se May quiser permanecer no poder, deve mudar a sua abordagem no que toca às negociações do Brexit. E há sinais que indicam que está preparada para o fazer.

Ao abordar as negociações, que começaram a 19 de Junho, com um espírito conciliador, pode ser possível um entendimento da agenda com a UE e concordar em continuar como membro do mercado único, por um período suficientemente longo para realizar todo o trabalho jurídico necessário. Isto seria um grande alívio para a UE, porque adiaria o dia do grande mal quando a ausência da Grã-Bretanha criasse um enorme fosso no orçamento europeu. E isto já seria um acordo ganhar-ganhar.

Somente seguindo este caminho, May poderá esperar persuadir o Parlamento a aprovar todas as leis que devem ser implementadas, uma vez terminadas as negociações do Brexit e o Reino Unido sair da União. Poderá também de ter abandonar a sua aliança mal ponderada com o Partido Unionista Democrático e ligar-se de forma mais enfática aos Conservadores da Escócia, que estão interessados numa versão mais suave do Brexit. May também terá de expiar os pecados dos Conservadores no bairro londrino de Kensington no que diz respeito ao incêndio da Grenfell Tower, no qual, pelo menos, 60 pessoas e talvez muitas mais, perderam a vida.

Se May abraçar esta plataforma, poderá continuar a liderar um governo minoritário, porque, deste modo, ninguém quererá ocupar o seu lugar. O Brexit ainda demoraria, pelo menos, uns cinco anos, durante os quais novas eleições teriam lugar. Se tudo correr bem, as duas partes podem querer voltar a casar-se, mesmo antes de se divorciarem.

Presidente do Fundo Soros e da Open Society. Autor de livros como a ‘Alquimia da finança’, ou o ‘O novo paradigma dos mercados financeiros: a crise de 2008’ e ‘A tragédia da União Europeia’.