Nelson Rodrigues

Nelson Rodrigues

REGULAÇÃO. Bancos estão a cobrar e descontar a quem solicita Visa. Regulador proíbe a prática e ameaça com responsabilizações, ao abrigo da lei cambial e outras do sector. Banco central só reconhece contratação de seguros, ou práticas previstas na lei dos cartões.

BPC

Banco de Poupança e Crédito (BPC) arrisca-se a várias penalizações do Banco Nacional de Angola por exigir dos seus clientes descontos e depósitos para conceder cartões de créditos e pré-pagos da rede visa. O banco central deixa isso claro em respostas enviadas ao VALOR.

De acordo com a direcção de supervisão comportamental do BNA, os bancos não devem estabelecer como condição de acesso aos cartões de créditos ou pré-pagos contrapartidas financeiras, sejam depósitos ou descontos de qualquer natureza, por não haver regulamentação.

“O Banco Nacional de Angola não emitiu regulamentação que determine a constituição de depósitos a prazos para a concessão de serviços aos clientes”, atesta o regulador, que assegura que qualquer medida neste sentido deva estar, no quadro do contrato, “sempre em observância com a constituição e a lei”.

O regulador acrescenta que qualquer actuação fora das normas estabelecidas pelo banco central, “sujeita as instituições financeiras bancárias à responsabilização nos termos da Lei de Bases das Instituições Financeiras, Lei Cambial e demais legislação aplicável”.

Os clientes do BPC estão a ser obrigados a constituir, por exemplo, um depósito a prazo de 250 mil kwanzas e terem na conta um saldo médio de 200 mil kwanzas para o acesso a cartões pré-pagos Visa ‘Gingongo’.

Segundo o BPC, o objectivo é comercial e visa “potenciar a prática de constituição de um colateral, um depósito a prazo no valor mínimo de 250 mil kwanzas e um envolvimento médio mínimo de 200 mil kwanzas nos últimos 12 meses”, por parte dos clientes.

Prática proibida também no Atlântico

Segundo soube o VALOR, o Banco Millennium Atlântico também tem estado a agir à margem das recomendações do BNA na relação com os utilizadores dos cartões visa, ao exigir um “desconto” de cinco mil kwanzas mensais na conta do cliente, medida que o banco apresenta como condição de acesso aos cartões Visa.

A referida prática também é proibida, considerando os esclarecimentos do BNA. “As instituições financeiras estão impedidas de vincular a emissão de cartão de crédito a qualquer tipo de operação financeira, como pré-requisito para a sua emissão, podendo a instituição financeira informar o titular sobre a possibilidade de contratar seguro para a cobertura de eventual saldo devedor em caso de sinistro, nos termos do n.º 2 do art.º 25.º do Aviso 5/2017, de 10 de Julho”, determina o banco central.

O presidente da Associação Angolana de Defesa do Consumidor (AADIC), Diógenes de Oliveira, confirmou o registo de queixas de clientes por o banco “estar a mexer nas contas dos clientes, sem autorização” e que “impõe que, todos os meses, se desconte cinco mil kwanzas” na conta do cliente.

“Se não aceita, não tem o cartão Visa. E, pior ainda, mexem na sua conta, sem a sua autorização. Para uns, pedem autorização por escrito, e retiram cinco mil kwanzas; fazem a oferta do Visa, com um saldo de 700 mil kwanzas.

Desses cinco mil kwanzas [descontados] dizem: ‘tens direito a descontos, em alguns sítios, como por exemplo, na biodente, com 15% de descontos naquilo que for pagar’”, queixou-se o Diógenes de Oliveira, ao analisar os casos BPC e BMA.

Contactado pelo VALOR, através do seu gabinete de comunicação institucional, o BMA entidade não deu qualquer resposta. Entretanto, o ‘team board’ de Massano admite que, “no âmbito da liberdade contratual, as instituições financeiras podem definir políticas e procedimentos de concessão de cartões de créditos”, desde que “não contrariem as regras definidas na regulamentação sobre cartões de pagamento”.

BANCA. Político e accionista maioritário do BANC pode ser obrigado a vender participações, caso o BNA conclua pela incapacidade financeira. Projecção é feita por economistas independentes, o CEIC e um consultor financeiro. Accionistas não reforçaram capital quando recomendado. Banco iniciou processo de encerramento de agências.

BANC

A saída de Kundi Paihama e sócios da estrutura accionista do BANC pode ser o desfecho do processo de saneamento determinado pelo Banco Nacional de Angola (BNA), que nomeou um conselho de administração provisório, constituído por quadros do banco central, caso se conclua pela incapacidade de manterem o banco operacional a níveis recomendáveis.

A antevisão é feita por vários analistas, entre os quais do Centro de Estudos e de Investigação Científica da Universidade Católica de Angola (CEIC). O BNA entende que as medidas de saneamento do BANC “visam a reposição dos termos de sustentabilidade financeira e operacional do banco, harmonizando-as com as normas vigentes para o exercício da actividade comercial bancária”, conforme uma nota emitida pelo conselho de administração do BNA, disponível no seu website.

Apesar de não ter as contas consolidadas divulgadas, fontes do mercado asseguram que o banco acabou 2017 com fundos próprios negativos. E há analistas que consideram que terá sido este o motivo da não divulgação das contas dentro dos prazos estabelecidos.

Para Lopes Paulo, a liquidação ou alienação da participação dos actuais accionistas “é um caso que pode ocorrer com o BANC”. “Não se descura que isso possa ocorrer. Mas terá de haver interesse dos accionistas em salvaguardar a posição actual ou o banco central poderá encontrar mecanismos diferentes, com injecção de liquidez, caso se mostre necessário. Ou então partir para o processo de passagem para outros accionistas que possam capitalizar o banco.”

Já Galvão Branco, empresário e consultor financeiro, considera que a possibilidade de alteração da estrutura accionista dos bancos, ou mesmo da alienação dos seus activos, já terá sido indiciada, com a nota do banco central que exigia o aumento de capital.

“Não há mais cá mecanismos milagrosos que atendam a situações técnicas desses bancos. Para esses casos, a solução só mesmo com regras técnicas”, aponta o dono da Gb-Consultores.

Recredit pode ajudar

Para o economista e investigador do CEIC Precioso Domingos, a outra via, para salvar o BANC, é por meio da Recredit, unidade financiada pelo Estado para gerir passivos dos bancos e demais activos tóxicos das instituições financeiras. Mas não descarta a hipótese de o BNA vir a exigir aos accionistas do BANC a alienação do capital, após resolução do caso. “Criou-se a Recredit para ajudar os bancos a limparem os seus passivos e malparados. Funcionou para o BPC. Não sei se terá funcionado para mais um banco. Mas não está a funcionar para o BANC. Não sei qual é o critério para se activar a Recredit”, sugere o economista.

Precioso Domingos critica ainda o facto de não haver, no país, uma “lei clara” sobre o resgate dos bancos em caso de falência.

Segundo o académico, o que acontece com bancos nestas condições são os ‘bailout’, ou seja, injecção de capital em caso de falências. “Houve o caso do BESA e não tenho dúvida de que, no caso do BANC, vá ocorrer praticamente o mesmo. Não de forma igual, mas certamente que aquilo vai beneficiar o banco.”

Banco encerra agências

A administração provisória do BANC iniciou o processo de encerramento de agências, dentro do saneamento financeiro. Esta medida foi saudada por Lopes Paulo, que considera ser “normal” para um banco com problemas de liquidez.

Assim, deixam de existir as agências da Estalagem, em Viana, e os centros de empresas da Maianga e da Marginal e a agência anexa às instalações da Universidade Metodista de Angola.

POUPANÇA. Banco está a exigir depósito a prazo de 250 mil a quem solicitar cartão de crédito da marca ‘Gingongo’. Entidade diz que medida não envolve o banco central. E fundamenta com necessidade de potenciar poupanças. Fonte do BNA garante que não há nenhum ‘despacho’ que autoriza esta prática. Penalização depende de queixa formal.

BPC1

Os clientes do Banco de Poupança e Crédito (BPC) estão a ser obrigados a constituir um depósito a prazo de 250 mil kwanzas e terem na conta um saldo médio de 200 mil kwanzas para o acesso a cartões pré-pagos Visa ‘Gingongo’.

A medida está em vigor, há já várias semanas, e resulta de uma estratégia do banco, fundamentada com a necessidade de se “potenciar a poupança por parte dos clientes, criando um círculo virtuoso de consumo consciente e balanceado com as reais capacidades do nosso país”.

“Trata-se de uma estratégia do BPC para atracção de novos clientes e domiciliação mais regular dos seus rendimentos no banco, assim como privilegiar os clientes regulares do BPC, como os funcionários públicos, forças da ordem e da segurança nacional e outros, que têm acesso ao produto em condições diferenciadas”, justifica o banco, para o qual o BNA “não se envolve nas abordagens de mercado dos bancos comerciais”.

O BPC, banco totalmente participado pelo Estado, justifica ainda que instituições bancárias definem “abordagens de forma a salvaguardar a sua estratégia e tácticas comerciais, que visam a estabilidade do seu balanço”. “Actualmente, é nosso objectivo comercial potenciar a prática de constituição de um colateral, um depósito a prazo no valor mínimo de 250 mil kwanzas e um envolvimento médio mínimo de 200 mil kwanzas nos últimos 12 meses, por parte dos nossos clientes, com o intuito de concretizar a nossa visão de sustentabilidade e estabilidade que definimos para o banco”, admite a entidade financeira que fechou os dois últimos balanços com prejuízos.

Questionado se a medida não choca com o instrutivo do banco central que proíbe cativações, a administração do BPC garante que a exigência dos depósitos a prazos não abrange as operações cambiais, transferências e compra de notas. Acrescenta que “são operações em que os clientes com rendimentos regulares domiciliados no banco têm atendimento preferencial, comparativamente a clientes que não têm um relacionamento regular com o banco”.

Fonte do BNA garantiu, entretanto, que a exigência de constituição de depósitos a prazos para ceder cartões não está regulamentada por “nenhum instrutivo” do banco central. Aliás, há mesmo garantia de que o Banco Nacional de Angola (BNA) “só não está a aplicar uma multa, porque ainda não recebemos queixa formal”.

“Não há documento que regulamenta isso”, disse a fonte do banco central. A adesão ao serviço dá direito a dois cartões “sujeitos a pré-carregamento em kwanzas, de montantes que são carregados em valor equivalente em dólares americanos (Cartão Gingongo em USD isento de comissões nos EUA) e em euros (Cartão Gingongo em EUR, isento de comissões na Zona Euro).

POLÍTICA MONETÁRIA. Economista arrasa decisão do banco central. E entende que números da inflação do BNA são “artificiais”. Há quem defenda a medida, com argumento de que ajuda no crédito e na liquidez em kwanzas. É a terceira vez, em oito meses, que se mexe nas reservas obrigatórias.

José Massano

A decisão do Comité de Política Monetária (CPM) em cortar 1,5 pontos percentuais (pp) na taxa básica de juro e dois pp no coeficiente das reservas obrigatórias animou, na semana passada, o sistema financeiro, por despertar a crença do aumento da liquidez, seja para crédito, seja para operações correntes. Mas o sentimento não é o mesmo para todos.

A taxa de juro básica (taxa BNA) desceu de 18% para 16,5%, quando o coeficiente de reservas obrigatórias recuou dos anteriores 19% para os actuais 17%, depois de já se ter situado nos 21% e 30%.

De acordo com o Banco Nacional de Angola (BNA), estas alterações tiveram como base a redução, pelo oitavo mês consecutivo, da taxa de inflação homóloga, assim como uma projecção oficial que já mostra que o quadro mantém abaixo da programação do Governo que estima 23% de inflação anual.

Se José Massano e a sua equipa justificam a redução da taxa BNA e do coeficiente das reservas obrigatórias com a queda da inflação, o mesmo argumento não colhe com o macroeconomista Yuri Quixina. Para este analista, a queda da inflação é “artificial”, defendendo a tese de consolidação da queda para a tomada de medidas de corte na taxa BNA e no coeficiente das reservas obrigatórias.

“Esta medida não é acertada porque não foi arrumada a bagunça da política orçamental. Ou seja, sem arrumar a casa, essas medidas são as mesmas que nos levaram à crise. Só é boa depois de arrumar a casa. E arrumar a casa é a política orçamental”, critica.

Para o também académico, não é a queda da taxa de inflação que deve influenciar a redução da taxa de juros.

“A queda da taxa de inflação [em Angola] é conjuntural; é artificial, porque derivou do adiamento das despesas por parte do Governo. O Governo é que fez a economia. É o que mais gasta na actividade económica. Como adiou algumas despesas, por exemplo, o pagamento da dívida do sector privado e salários [da função pública], com a teoria dos técnicos não cadastrados, isso tudo faz com que haja uma contenção na procura”, defende o especialista.

Yuri Quixina entende que a queda da inflação em que o banco central assenta as decisões pode estar associada à “ perspectiva de atrasar salários”. O analista sublinhou mesmo que há já algum tempo que o Estado não remunera trabalhadores antes do dia 30. “O Estado nunca [mais] pagou dia 25 ou dia 30. Está a pagar dia 15 [do mês seguinte]. E quando os salários caem, as pessoas naturalmente têm de pagar dívidas. E ficam com pouco dinheiro para pressionar preços”, reforça.

Desde que José Massano regressou ao BNA, esta é a terceira vez que o CPM mexe no coeficiente de reservas obrigatórias, processo iniciado em Dezembro do ano passado, quando o coeficiente se situava nos 30%. Ainda na ressaca da sua renomeação para o posto de governador do banco central, Massano inaugurou a agenda com um corte de dois pp ao índice das reservas para 21%. Medida que foi saudada positivamente pelo facto de deixar de incluir, no cabaz de reservas, os títulos do Estado. Passados oito meses, em Maio deste ano, o governador voltou a mexer nas reservas obrigatórias, cortando de 21% para 19%, até à semana passada, quando deu mais uma folga aos depósitos dos bancos, com uma redução de 2pp para 17%.

Caminhos a seguir…

Ao contrário de José Massano, assim como da maioria dos empresários, Yuri Quixina sugere que, primeiramente, o BNA devia consolidar a queda da inflação. “No actual quadro, quem ganha é o Estado, devido às taxas de juros dos títulos que, por conta dessas medidas, ficam mais baixas”, defende.

“O BNA só devia trazer essa estratégia se a casa ou a matriz orçamental tivesse arrumada. O que o BNA está a fazer a economia recuperar artificialmente, porque este todo dinheiro [que se vai libertar] vai para o Estado, que vai pagar em taxas mais reduzidas; vai pressionar com que a taxa de juros nos títulos do Estado caia. E o Estado fica feliz porque vai pagar pouco”. Yuri Quixina alerta que os bancos podem “entrar em conflito e desvantagens, na medida em que emprestaram a uma taxa mais elevada e o Estado vai pagar pouco.

E pode até resultar numa recuperação derivada de dívidas. Ou seja, a taxa de juros baixa sem arrumar a casa, a economia cresce com dúvidas”. …para aumentar liquidez Entre os que saúdam a decisão do banco central, encontra-se Associação Industrial de Angola (AIA).

O presidente José Severino acredita que, com a medida, os bancos passam a ter mais disponibilidades. “Baixando-se o nível das reservas obrigatórias, os bancos ficam com mais liquidez para financiar a economia. Isto é, têm de financiar a economia para porem o dinheiro a girar. Salvo se continuarem a comprar títulos da dívida pública indexada ao dólar”, afirma o líder empresarial.

José Severino serve-se ainda das estatísticas do crédito do BNA para dizer que esta componente registou um aumento 3,55% em Junho face a igual período anterior. Para ele, só isso já indicia “algo de bom”. Apesar disso, e mesmo com o aumento da liquidez, Severino alerta para o facto de o Estado prestar maior atenção aos subsídios a juros.

Para este líder associativo, enquanto o “Estado não tiver recursos para subsidiar juros, os bancos terão sempre receio em financiar”. E dá exemplo do ‘Angola Investe’, que gerou algum “impacto na economia”. “Só há uma forma de o Estado arranjar dinheiro para subsidiar juros, que é, caricatamente, os bancos voltarem a pagar a taxa de 35% de imposto industrial, em vez dos 30%. Se fizermos esses 5%, cada banco faria uma cativação de 5%, com o controlo das finanças, que depois iria subsidiar juros dos projectos dos seus próprios clientes”, considera o também economista, que antevê avanços na economia já a partir de Janeiro.

Também Francisco Paulo, economista e investigador do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC), da Universidade Católica de Angola, considera que a medida do BNA ajuda os bancos a “libertarem mais créditos”, lembrando que o mecanismo seguido até esta última alteração “custou ao país um atraso no crescimento económico”.

“Essa redução da taxa de juro básica e das reservas tem como objectivo proporcionar mais liquidez ao sistema bancário. Até agora, a política que o BNA tomou era de redução da liquidez, para controlar a inflação. A política monetária contraccionista faz com que as taxas de juro para a obtenção de empréstimos por parte dos empresários sejam elevadas, o que inibe os empresários de obterem crédito”, comenta Francisco Paulo, no que é seguido por João Fonseca.

Para este analista do mercado, a medida liberta igualmente liquidez, outro objectivo da mexida na taxa básica e no coeficiente das reservas obrigatórias é o “controlo da inflação”. “As taxas de juros do mercado bancário têm de acompanhar esse sentido. As taxas de juros ‘overnight’ têm aumentado. Com esta alteração, o BNA aumenta liquidez para os bancos que dela necessitam e permite baixar a ‘luibor’, que tem impacto na economia”.

BANCA. Sonangol, TAAG, ENSA e outros accionistas vão esperar mais três anos para verem retorno do BCI. PCA da entidade justifica medida com prejuízos acumulados. Maioria das empresas não injectou fundos no banco quando necessário. Antes dos lucros, banco tinha “má imagem”, contabilidade duvidosa e levou sete reservas de auditores.

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Os accionistas do Banco de Comércio e Indústria (BCI) não vão receber dividendos dos lucros recolhidos em 2017 e dos anos subsequentes até a entidade apagar dos registos contabilísticos os prejuízos acumulados dos anos anteriores, medida que deve durar três anos.

A estratégia surge pela necessidade de o banco limpar dos históricos as perdas registadas entre 2012 e 2015. Já os exercícios financeiros de 2016 e 2017 foram os melhores da história recente do banco e da gestão de Filomeno Ceita que lidera a instituição desde finais de 2011. Em 2016, o banco registou lucros de 302 milhões de kwanzas e, em 2017, de 663 milhões (ver gráficos).

“Não podemos dar destino nenhum [dos dividendos] enquanto não tivermos ultrapassado as perdas anteriores. Essa é a regra contabilística. Os accionistas não beneficiaram. Temos empresas públicas entre os accionistas. Nenhuma beneficiou porque já temos prejuízos anteriores”, revelou, ao VALOR, o presidente do conselho de administração, Filomeno Ceita. “Três anos é perfeitamente suficiente”, estimou o gestor à margem de uma conferência de imprensa, para saudar o 27º aniversário do BCI.

Segundo Filomeno Ceita, não haverá uma divisão imediata dos dividendos também porque “uma boa parte dos accionistas está em dívida, porque não capitalizou quando devia capitalizar”. “Quando tivermos essa situação mais ou menos limpa, temos de fazer essas contas”, garantiu Ceitas, para quem a maioria dos accionistas “não tem uma saúde financeira por aí além”.

Até Dezembro passado, integravam a estrutura accionista do BCI o Estado, com 93,60%, o Porto de Luanda, a Sonangol, a TAAG e a ENSA, estas três últimas com 1,3%. Do grupo, estão ainda a Cerval (0,45%), Angola Telecom (0,45%), Endiama (0,45%), TCUL (0,45%) e a Bolama (0,08%).

PASSADO DE “MÁ IMAGEM” …

Dados apresentados pelo conselho de administração mostram que, em 2012, que foi o primeiro ano completo de liderança de Ceita, a entidade tinha “contabilidade muito pouco credível”, “má imagem” e “grande desmotivação no seio dos trabalhadores”. Havia também “milhões de dólares por regularizar”, estimando-se em cerca de 50 milhões. O relatório faz ainda referência à “prática regular de refinanciamentos administrativos”.

Só em 2012, o banco do Estado já tinha levado sete notas negativas dos auditores independentes. Este número baixou para zero até ao final de 2017, depois de se ter situado nas duas reservas e uma, em 2015 e 2016, respectivamente.

Entram ainda no ‘currículo’ de Ceita a gestão do programa de crédito do Governo ‘Projovem’, gerido pelo BCI. Desde que foi instituído, o banco já financiou cerca de 3,9 mil milhões de kwanzas, para 276 projectos aprovados. O número inicial de projectos era 1.373, dos quais 701 ficaram pendentes.

Da agenda de Ceita no BCI, constam a retoma de programas do Governo que ficaram paralisados, pagamento de dívida dos clientes junto de instituições públicas; o aumento de parceria com o Estado e com as empresas públicas; e subida “significativa” da liquidez e dos canais de distribuição. Não consta dos planos do banco a fusão com o BPC ou com qualquer outra entidade financeira.

Banco com 20% de malparado

Pelo menos 20% do total da carteira de crédito do BCI entrou em incumprimento até Dezembro de 2017, quando o banco fechou o balanço do referido período. Os números são da direcção de contabilidade e finanças, que aponta o crédito às empresas a rubrica com maior tendência para não honrar compromissos de crédito a tempo.

Apesar disso, o banco considera que a taxa esteve três pontos percebntuais abaixo do registado no período anterior, quando a contabilidade registou apenas 17% da taxa de crédito vencido com respeito ao total.

“Em 2017, a taxa de crédito vencido sobre o crédito total situou-se em 20%. Esteve ligeiramente acima da registada em 2016, que foi de 17%, mas [esteve] muito abaixo das taxas dos anos anteriores, que estiveram acima de 30%. Ou seja, o ano de 2017 foi particular por causa da situação macroeconómica do país”, assegurou Mateus Canha, responsável da área de contabilidade.

Para o gestor, a carteira de crédito do banco é caracterizada essencialmente pelo crédito concedido às empresas. Aliás, é a este grupo que a “taxa de incumprimento recai mais” contra os particulares.