Geralda Embaló

Geralda Embaló

Directora-geral adjunta do Valor Económico

A semana que passou foi mais uma de celebração da Dipanda e já se vai tornando hábito a actualidade ser marcada por manifestações um pouco por todo o país, sobretudo marcada pela repressão policial a essas manifestações, que leva invariavelmente a detenções arbitrárias, à violência policial e, no ano passado, até à morte. A vida do jovem Inocêncio de Matos foi tirada numa manifestação a que tinha direito consagrado, e tirada por autoridades encarregadas pela segurança do público como ele. E, um ano mais tarde, a impunidade sobre esse crime que mutilou certamente aquela família que poderia ser a de qualquer um de nós, é total, assim como é a impunidade sobre as mortes que aconteceram em Cafunfo e para as quais não se conhecem responsabilizações sérias num desrespeito exibicionista quanto a direitos humanos básicos. 46 anos de Independência e a nossa democracia continua a não ter esses direitos à expressão e à liberdade de manifestação, consagrados na prática fora do papel. Mas 46 anos de Independência traduzidos numa democracia infantil quanto a direitos humanos revelam-se de diferentes formas conexas. Revela-se na falta de qualidade de vida dos cidadãos, na falta de perspectivas socioeconómicas, na falta de resiliência do tecido empresarial nacional que o Governo inadvertidamente parece incentivar com as intrusões constantes no espaço que deveria ser do empreendedorismo privado. Olhando para os indicadores de desenvolvimento socioeconómico, é fácil encontrar áreas em que a infantilidade é manifesta. O acesso à energia e água, o acesso à educação e saúde de qualidade são alguns. A partidarização das instituições como a polícia como os tribunais... São infantilidades que levam a perguntar quantos anos mais serão necessários para que Angola alcance o potencial que anda há décadas a prometer por conta de tanto recurso natural que tem.

 A semana que passou, particularmente para quem se interessa por tecnologias, foi marcada pelo anúncio do jovem dono do Facebook de que o Face vai deixar de o ser para se tornar na marca Meta, o nickname da Metaverse, que será a marca mãe dona do Facebook e de todas as outras empresas do grupo. A palavra Metaverse, de origem grega, significa qualquer coisa como “há sempre mais para construir” e Zuckerberg quer que a Meta seja o ‘re-branding’, a nova face das mais recentes tecnologias que, como as redes sociais fizeram no passado, vão invadir e revolucionar ainda mais o nosso dia-a-dia. A apresentação dos planos da empresa é impressionante, futurista, inclui avatars que projectam a imagem inteira de uma pessoa em 3D num espaço onde não está e que vão mais longe no conceito de aproximar distâncias que as redes e a comunicação online já conseguiram encurtar. Quando me lembro que vivíamos sem telemóveis, essa realidade parece pertencer quase à idade média...

A semana que passou foi de discurso sobre o Estado da Nação e, como era expectável, só um moroso desconversar de alto nível poderia distrair do tal estado do Estado. Sobretudo um desconversar que mascare a facilidade com que num país que vai na sexta recessão – cuja economia é refém de um desemprego galopante, que enfrenta uma seca violenta, muita fome que já não se restringe às regiões afectadas pela seca mas que se espalha por todo o país, um país que tem uma falta crónica de infra-estruturas de saneamento que desincentivam o investimento, que não fornece àgua, ou energia de forma sustentada – só um desconversar de alto nível pode tentar mascarar decisões de alocar vários milhões de dólares a supérfluos como compras de instalações para ministérios, ou apartamentos e Lexus para o sector da justiça que se quer manter manietado. E agora pergunto eu, com tanta apreensão de prédios instalações e afins, ainda é preciso comprar apartamentos e escritórios para servidores públicos? Mas o que raio se passa que o Governo anda tão dissociado da realidade depauperada do país e até do seu próprio discurso de sucesso? Se o combate à corrupção em quatro anos tem registo de sucesso, milhões apreendidos, porque não é visível o benefício para os cofres públicos que ainda é preciso nesta altura comprar instalações para servidores públicos?