António Nogueira

António Nogueira

INDÚSTRIA. Empresa prevê igualmente, até finais do próximo ano, aumentar níveis de produção de açúcar, tendo já dado início ao processo de moagem de cana.

 

A Companhia de Bioenergia de Angola (Biocom) prevê produzir, até ao final do próximo ano, 15.278 metros cúbicos de etanol, o que deverá permitir a comercialização de 200 mil megawatts (MW) de energia eléctrica à Rede Nacional de Transporte de Electricidade (RNT), a entidade pública vinculada ao Ministério de Energia e Águas e que detém o estatuto de ‘comprador único’ da energia produzida no país.

A revelação é do director-geral adjunto da empresa, Luís Bagorro Júnior, que, em recentes declarações à imprensa, assinalou ainda que as metas actuais superam os resultados do ano passado, em que a produção de etanol se fixou em 14.263 metros cúbicos, o que permitiu a ‘exportação’ (venda) de 57 mil MW de energia eléctrica à RNT.

Até finais do próximo ano, a Biocom prevê igualmente aumentar os níveis de produção de açúcar, tendo já dado início ao processo de moagem de cana, no passado dia 29 de Junho, para a safra 2017/2018.

Para o período em referência, a empresa estabeleceu uma meta de produção de 62.947 toneladas de açúcar, um volume 15% superior ao resultado alcançado no ano passado, quando foram produzidas 52 mil toneladas do produto.

Para atingir a meta de produção ,deverão ser processadas, este ano, na unidade agro-industrial da empresa, em Cacuso, Malanje, 601 mil toneladas de cana-de-açúcar, colhidas numa área de 12.600 mil hectares.

Em 2016, segundo os dados da empresa, a moagem foi de 510 mil toneladas de cana e a área de colheita foi de 9.272 hectares.

SECA ATRAPALHA

Segundo Luís Bagorro Júnior, os motivos do aumento nos volumes de produção estão na contínua expansão do plantio e nos ganhos de produtividade obtidos a cada ano, tanto na área agrícola quanto na indústria.

Entretanto, segundo afirma, os números poderiam ser ainda maiores se não fosse a seca, sendo que este ano choveu 25% a menos do que a média histórica. “Para reduzir esse efeito no futuro, a empresa irá multiplicar as variedades de cana mais adaptadas a este clima e que proporcione também uma alta concentração de açúcar”, assinalou.

Júnior considera os actuais resultados “satisfatórios”, atribuindo o “sucesso” ao investimento que tem sido feito em novos equipamentos, em tecnologia de ponta e na formação de recursos humanos.

Com base nesse quadro, assegura que a Biocom deverá atingir as metas de produção previstas, acreditando que o projecto, quando atingir a sua fase de maturidade, na safra 2021/2022, deverá permitir a produção de 256 mil toneladas de açúcar (o equivalente a 60% do total do consumo actual no país), além de 33 mil metros cúbicos de etanol anidro e 235 mil MW de energia eléctrica.

Outro aspecto destacado por Luís Bagorro Júnior é a evolução no número de trabalhadores angolanos a ocupar cargos técnicos e de liderança na empresa. No último ano, segundo o gestor, a presença de expatriados diminuiu, sendo que, actualmente, 93% dos trabalhadores são angolanos.

Para o arranque do projecto da Biocom, para a produção de açúcar, etanol e electricidade, em Malanje, foram investidos 750 milhões de dólares, segundo os dados oficiais. A Biocom é composta por três grupos associados, nomeadamente a Cochan (40%), Odebrecht Angola (40%) e Sonangol Holdings (20%).

LIDERANÇA. Análise ilustra expectativas dos CEO mundiais “face à evolução dos negócios, dos desafios e das estratégias para os próximos três anos. Este ano, porém, o optimismo dos inquiridos é mais moderado em relação a 2016.

 

Pelo menos, 65% dos CEO, a nível mundial, manifestam confiança na evolução da economia mundial, nos próximos três anos, conclui a edição de 2017 do estudo Global CEO Outlook, realizado pela consultora KPMG, divulgado na passada quinta-feira.

Na análise, que ilustra as expectativas dos CEO mundiais “face à evolução dos negócios, dos desafios e das estratégias para os próximos três anos”, o optimismo dos CEO inqueridos pela consultora é mais moderado em relação ao passado, em que o registo, em termos de optimismo, foi de 80%.

Ainda de acordo com a análise, 74% dos directores executivos afirmam que a empresa que lideram pretende ser disruptiva no seu sector de actividade e 83% estão confiantes quanto às perspectivas de crescimento nos próximos três anos.

Destes, 47% dizem estar “muito confiantes”. Cerca de sete em 10 CEO procuram desenvolver as suas competências e qualidades pessoais, “no sentido de melhorarem as suas capacidades de liderança”.

Com a adopção de tecnologias cognitivas, os negócios esperam um crescimento nos quadros de pessoal a curto prazo. Em 10 funções-chave, 58% dos CEO esperam um “ligeiro ou significativo” aumento no número de colaboradores.

Segundo o ‘global chairman’ da KPMG, John Veihmeyer, os CEO compreendem que rapidez e inovação são prioridades estratégicas para crescer num contexto de incerteza e, simultaneamente, “são pragmáticos na gestão da incerteza, o que inclui fortalecer o negócio nos mercados existentes, de forma a protegerem os seus resultados enquanto procuram tirar partido de novas oportunidades”.

O estudo, que incluiu CEO de empresas a operar em 11 indústrias de 10 países, concluiu que a liderança está atenta às mudanças geopolíticas: 43% está a reavaliar a presença geográfica, em resultado das alterações ao ritmo da globalização e ao proteccionismo, 52% acredita que o ambiente político tem agora um maior impacto na organização e 31% crê que as medidas proteccionistas vão aumentar nos próximos três anos.

Uma das mudanças “mais marcantes” na edição deste ano do Global CEO Outlook é o aumento do número de CEO que classificam o risco reputacional como uma preocupação prioritária. Enquanto em 2016 não figurava no top 10, este ano é o terceiro risco mais importante, num total de 16. Os líderes consideram ainda que o risco reputacional tem o segundo maior potencial de impacto na performance dos próximos três anos.

A cibersegurança, que, em 2016, era vista como a maior ameaça, surge este ano em quinto lugar, “reflectindo a opinião dos CEO sobre o progresso das empresas na gestão do risco informático”. Hoje, quatro em cada 10 dizem estar preparados para um acontecimento informático.

A KPMG entrevistou 1.261 CEO em 10 países, nomeadamente Austrália, China, França, Alemanha, Índia, Itália, Japão, Espanha, Reino Unido e Estados Unidos e 11 indústrias chave – automóvel, banca, infra-estruturas, seguros, gestão de investimentos, ciências da vida, produção, retalho/mercados de consumo, tecnologia, energia/serviços e telecomunicações. Um terço das empresas incluídas no estudo regista ganhos anuais superiores a 10 mil milhões de dólares.

RESOLUÇÃO DE LITÍGIOS. Regulamento prevê, designadamente, que notificações a efectuar entre partes e tribunal sejam feitas por via electrónica ou que processo arbitral decorra dentro de prazos. apertados.

 

O Centro de Resolução Extrajudicial de Litígios (CREL) do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, o primeiro que se encontra a funcionar de forma efectiva, em Angola, já conta com um Regulamento de Arbitragem próprio, estando a vigorar, desde o passado dia 11 de Maio, após ter sido publicado em Diário da República.

De acordo com os dados oficiais, o CREL foi criado, em 2014, como um centro público de arbitragem, com o propósito de colmatar a falta de actividade dos centros de arbitragem privados, procurando servir de motor para incentivar a utilização da arbitragem como método extrajudicial de resolução de litígios.

Porém, até à publicação do regulamento, o CREL só podia acolher arbitragens ad hoc, sendo que não dispunha de um quadro regulador de arbitragem próprio. Com a publicação da regulamentação em causa, este passa a poder acolher arbitragens institucionais, que se desenrolam segundo a tramitação processual nele prevista.

Os dados oficiais indicam ainda que, apesar de o Ministério ter aprovado a criação de quatro centros de arbitragem privados em 2012, até ao momento, nenhum deles desenvolve qualquer actividade, estando ainda pendentes dois pedidos de aprovação de centros de arbitragem.

Os especialistas da MG Advogados explicam, num artigo a respeito do regulamento em causa, que, caso os interessados pretendam submeter os litígios oriundos de um determinado contrato a arbitragem, é necessário, por um lado, incluir no contrato a celebrar uma cláusula arbitral que confira ao CREL competência para administrar a arbitragem.

No caso de o contrato ser anterior à entrada em vigor do Regulamento de Arbitragem do CREL, é necessário que as partes assinem um compromisso arbitral, através do qual atribuem ao CREL o poder de administrar a arbitragem, quanto ao litígio com que se deparem.

Segundo os analistas da MG Advogados, o Regulamento de Arbitragem do CREL “é um regulamento moderno, simples e de fácil aplicação. Nele se prevê, designadamente, que as notificações a efectuar entre as partes e o tribunal sejam feitas por via electrónica ou que o processo arbitral decorra dentro de prazos apertados”.

O documento tem, anexo, um Regulamento sobre o Árbitro de Emergência, destaca ainda a MG Advogados, reforçando que “este expediente, de grande utilização a nível internacional, permite que as partes, numa arbitragem, possam, ainda antes de constituído o tribunal arbitral, solicitar ao CREL que designe um árbitro único que, num espaço máximo de dez dias, tomará uma decisão final sobre uma providência cautelar ou uma ordem preliminar que lhe tenha sido requerida com carácter de urgência”.

O Código de Deontologia Profissional dos Árbitros foi também publicado como anexo ao Regulamento do CREL, estando nele estabelecido um conjunto de regras deontológicas e comportamentais que os especialistas que actuam nas arbitragens administradas pelo CREL devem observar. Impõe-se, designadamente, aos árbitros, que revelem às partes qualquer situação que possa colocar em causa a sua independência e imparcialidade.

A operar em Angola há sensivelmente 30 anos, a BIAL, uma farmacêutica que actua também nos mercados da Europa e da América do Norte, prepara, para breve, o lançamento de um novo antipalúdico – o Malacur – no mercado angolano. Em entrevista ao VALOR, o CEO da empresa admite que o ambiente de negócio em Angola é negativo nos últimos dois anos, mas assegura, ainda assim, a continuidade dos investimentos fruto da parceria “estratégica” que mantém com o Estado.

 

A BIAL acaba de apresentar, em Angola, o anti-paludíco Malacur. Em termos gerais, como se processa o mecanismo de acção desse novo fármaco no organismo humano?

O Malacur é um fármaco para o tratamento da malária que tem uma série de características positivas que, esperamos, possam realmente ajudar os países que padecem dessa doença, como é o caso de Angola. É um fármaco que tem alguns benefícios. Não precisa, por exemplo, de ser tomado com comida, tal como outros fármacos. Segundo o que nos explicam alguns dos médicos com quem falámos, uma criança que tem malária, mesmo após a medicação, ao fim de 24 ou 48 horas, não tem vontade de comer. E aí o medicamento não faz efeito. O Malacur só precisa de ser tomado com água. Não tem esse desconforto adicional para com os pacientes. Por outro lado, além de tratar a malária em apenas três dias, gera um período de profilaxia de 46 dias. Ou seja, o doente que toma o Malacur fica tratado e, depois de seis semanas, fica também imune, sem o risco de apanhar novamente a malária. Portanto, o que este medicamento está a proporcionar é um período de protecção. É um medicamento que tem três anos de validade, mais um ano do que os habituais.

Nesta primeira fase, a BIAL procedeu somente a apresentação do Malacur. Para quando está prevista a sua disponibilização no mercado angolano?

Neste preciso momento, estamos a trabalhar muito estreitamente com as autoridades angolanas e com os médicos, procurando assegurar que o medicamento esteja disponibilizado, havendo também, em simultâneo, acções de formação e havendo percepção de onde é que deve ser utilizado, para além de haver a necessidade de se definir bem que doentes vão beneficiar deste medicamento. Portanto, estamos a trabalhar com as autoridades nisso e esperamos tê-lo disponível nas próximas semanas.

Estarão já criadas as condições para que não haja ruptura de stocks deste fármaco em Angola?

Trabalhamos há cerca de 30 anos em Angola e é um compromisso que temos nos países onde estamos, que é procurar encontrar soluções e fazermos os investimentos necessários para que não faltem produtos no mercado. Sabemos que tem existido, nalguns casos, falhas de medicamentos, nós temos cerca de 40 medicamentos disponíveis no mercado e procuramos garantir que não haja de falhas. Este é o nosso compromisso. Trabalhar para que não existam estas falhas no mercado, nomeadamente numa patologia tão séria como a malária.

Qual é o volume de investimento que o lançamento do Malacur em Angola exigiu da empresa?

São números que, neste preciso momento, prefiro não partilhar. O que posso dizer é que, por ano, investimos cerca de 50 milhões de euros em investigação e desenvolvimento de novos medicamentos para trazer ao mercado. Obviamente que os custos relacionados ao Malacur são muito inferiores a estes. Ou seja, há outros que têm mais custos. Temos um compromisso muito grande com os novos medicamentos que pretendemos trazer para o mercado.

Na qualidade de investidor, como avalia o ambiente de negócios em Angola?

O ambiente para o investimento em Angola, fruto da crise, tem sido regra geral negativo nos últimos dois anos. Acredito que o Executivo tudo tem feito para inverter este sentimento. A BIAL tem investido continuamente em Angola e continuará a fazê-lo, até porque a nossa “parceria” com Angola é estratégica, e para manter, e não se vê apenas nos momentos positivos.

Voltando ao Malacur. Em Angola, a BIAL prevê disponibilizar, numa primeira fase, apenas os comprimidos, estando o lançamento do xarope programado para mais tarde. Há algum motivo especial para que assim seja ou é apenas uma estratégia comercial?

Neste momento, vamos disponibilizar apenas os comprimidos, mas, logo a seguir, vamos disponibilizar não os xaropes, mas os comprimidos dispersíveis. Sabemos que há também outros fármacos em xaropes para o tratamento da malária, mas o Malacur existe também em comprimidos dispersíveis, o que permite dissolver em água, utilizando exactamente a dose correcta. Para o xarope, muitas vezes, tendo em conta o peso, é muito difícil encontrar a dose ideal. A opção no desenvolvimento do Malacur foi o comprimido dispersível que foi adaptado à dose da criança.

Qual é a receptividade que este novo fármaco está a merecer por parte das autoridades angolanas ligadas à área da saúde?

Posso dizer que a receptividade tem sido muito boa. Percebemos que há uma grande preocupação em relação à malária, em toda a cadeia dos organismos que compõem a área da saúde em Angola. Obviamente, as autoridades ficaram encorajadas por haver uma nova opção terapêutica. Mas, tendo em conta a dimensão do flagelo, em Angola, é lógico que queiram garantir também que é tudo feito da melhor forma possível.

Para além de Angola, há outros países em África onde tencionam fornecer o Malacur?

Neste momento, só fizemos a apresentação deste medicamento em Angola, mas prevemos também fazer a distribuição noutros mercados, nomeadamente em Moçambique.

Que informação é que tem em relação o nível de prevalência da Malária em Angola e em África?

Temos dados da Organização Mundial da Saúde. Segundo a OMS, aproximadamente 50 por cento da população mundial está exposta ao parasita da malária, em 91 países endémicos. Anualmente, morrem, por malária, entre 500 e 600 milhares de pessoas no mundo. Estima-se que, por ano, ocorram mais de 200 milhões de casos em todo o mundo, sendo que 90% são na África Subsariana. A OMS diz também que 90% dos casos de malária e das mortes ocorrem no continente africano, registando-se 848 milhões de pessoas com risco de contrair malária, 690 milhões das quais com alto risco.

A BIAL terá planos de algum dia instalar uma fábrica para produção de fármacos em Angola, tendo em conta os níveis de prevalência de doenças como a malária?

Hoje, vendemos os nossos medicamentos para 58 países e temos apenas uma unidade industrial, sedeada no Porto, que suporta estes 58 países. Neste momento, não temos a intenção de construir mais nenhuma unidade industrial, porque temos a perfeita capacidade para gerir aquilo de que necessitamos nos países a que me referi. Se, em algum momento, entendermos que a nossa capacidade não chega, deveremos equacionar este aspecto.

Que outros medicamentos a empresa já lançou no mercado?

Temos uma área de investigação e desenvolvimento há cerca de 25 anos. Temos hoje cerca de 100 investigadores a trabalhar na nossa equipa. Nos últimos anos, desenvolvemos dois medicamentos para o tratamento de epilepsia que foram lançados em 2009 e que estão hoje presentes em dezenas de países da Europa, Estados Unidos e Angola. E desenvolvemos um segundo medicamento para tratamento da doença de Parkinson que foi aprovado pela Comissão Europeia para uso em toda a Europa, no ano passado. Ainda só o temos lançado em três países, nomeadamente na Alemanha, Inglaterra e Espanha, mas prevemos lançá-lo noutros países.

Em que áreas da medicina a empresa tem estado actualmente focada a nível da investigação para a descoberta de novas soluções terapêuticas?

Na área de investigação, as duas grandes apostas que temos é a área do sistema nervoso central, portanto a área da neurologia, e a área cardiovascular. Os dois medicamentos que desenvolvemos, um para a epilepsia e o outro para a doença de Parkinson. Portanto, duas doenças do foro neurológico.

Neste momento, como é que a BIAL se posiciona no contexto internacional do negócio farmacêutico?

No contexto internacional, somos uma pequena e média empresa. Temos muito menos recursos e capacidades do que as grandes multinacionais. O que significa que temos de crescer muito mais focados naquilo que fazemos. Não podemos investigar em muitas áreas, porque não temos tanta capacidade de investimento, não dispomos de recursos humanos para desenvolver todo esse trabalho e, por isso, temos de ser muito focados e eficientes naquilo que fazemos. Mas, em Angola, a BIAL é a top três de vendas de medicamentos.

PERFIL

António Portela é licenciado em Economia, pela faculdade de Economia da Universidade do Porto e possui um MBA Executivo da Porto Business School. Iniciou a sua actividade profissional na farmacêutica Roche, no Reino Unido, onde foi delegado de informação médica. Nesta empresa, desempenhou também as funções de analista de mercado para as unidades de negócio de oncologia e hematologia. Foi igualmente responsável pela Roche European Business Platform e, ainda na Roche no Reino Unido, foi gestor de produtos da Hepatite C. Integrou a equipa da BIAL em 2004. Em Janeiro de 2011, António Portela assume funções de CEO da BIAL, marcando a chegada da quarta geração da família à frente do considerado maior grupo farmacêutico português, fundado em 1924 pelo seu bisavô, Álvaro Portela.

ANÁLISE. Crescimento da África Subsariana continuará a ficar muito abaixo das tendências passadas que rondavam entre os 5% e 6% e apenas ligeiramente acima da taxa de crescimento da população. O último relatório do FMI sobre a região saiu no início deste Maio.

 

Em vésperas da celebração do Dia de África, a assinalar-se no próximo 25 de Maio, o VE faz uma incursão à actualidade da cena económica no continente. Na África Subsariana, mais especificamente, há indicadores optimistas para alguns países, como o Senegal e o Quénia que continuam a crescer acima dos 6%. No entanto, de uma forma geral, o crescimento na região caiu para o nível mais baixo registado em duas décadas, segundo o mais recente relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI), sobre as perspectivas económicas regionais, divulgado no início deste mês.

O documento reporta que o crescimento abrandou em dois terços nos países da região, sendo de destacar Angola, que teve um crescimento quase nulo, Nigéria (-1,5%), África do Sul (0,5%), Namíbia (0,5%), entre outros, o que fez com que, no final de contas, o crescimento médio anual da região caísse para 1,4% em 2016. Apesar deste quadro, o FMI acredita numa “recuperação modesta” do crescimento em 2017, para 2,6%, mas, no relatório, a instituição do Bretton Wood refere que o ritmo do crescimento regional permanece fraco, um cenário que, a persistir, deverá manter o crescimento da África Subsariana muito abaixo das tendências passadas que rondava entre os 5% e 6%, e apenas ligeiramente acima da taxa de crescimento da população.

Os países exportadores de matérias-primas, como Angola e a Nigéria, foram os mais atingidos pela nova onda de abrandamento económico na chamada ‘África negra’, mas a ‘hecatombe’ não poupou também os países da Comunidade Económica e Monetária da África Central (CEMAC), composto pelos Camarões, Gabão, Guiné Equatorial, Congo, República Centro-Africana e o Chade que, no entanto, fecharam o ano passado com um crescimento médio de 3,7%.

Embora conclua que muitos países tenham sofrido os efeitos de um choque substancial dos preços das matérias-primas, o FMI aponta também para o “ajustamento insuficiente” das políticas como uma das causas do abrandamento generalizado do crescimento na região da África Subsariana.

“Os atrasos na aplicação de políticas de ajustamento de importância crítica estão a provocar o aumento da dívida pública, criar incertezas e adiar os investimentos, e ameaçam gerar dificuldades ainda mais graves no futuro”, concluem os analistas da instituição. Entretanto, segundo ainda o FMI, as vulnerabilidades estão também a emergir nos países cujas exportações não são fortemente dependentes das matérias-primas, como são os casos da Costa do Marfim, Quénia e Senegal.

Embora estes países tenham mantido taxas de crescimento elevadas na generalidade, na ordem dos 6%, já há vários anos registam grandes défices orçamentais, “à medida que os seus respectivos governos procuram, acertadamente, colmatar os défices sociais e de infra-estruturas”. A consequência actual, porém, é a elevação da dívida pública e dos custos de endividamento.

CONJUNTURA EXTERNA DESFAVORÁVEL

O relatório ressalta, por outro lado, que, embora a conjuntura externa se tenha tornado mais favorável recentemente, deverá proporcionar um apoio apenas limitado. Segundo os analistas do FMI, as melhorias recentes nos preços das matérias-primas oferecem alguma margem de manobra, mas não o suficiente para abordar os desequilíbrios existentes nos países intensivos em recursos.

“Os preços do petróleo, por exemplo, deverão continuar muito abaixo do nível máximo registado em 2013. Da mesma forma, a despeito da sua tendência decrescente desde o início de 2016, os custos financeiros ainda são mais altos nas economias de fronteira da região do que nos outros mercados emergentes”, refere o documento, salientando que estes poderiam sofrer um novo aperto num contexto de abrandamento da política orçamental e normalização da política monetária nos Estados Unidos.

As perspectivas são também ‘obscuras’ devido à incidência de secas, pragas e problemas de segurança, segundo o relatório que, embora reconheça que o impacto da seca que atingiu parte da África Austral em 2016 se esteja a dissipar, alerta que a insegurança alimentar parece estar a crescer em partes da África Austral e Oriental que sofrem os efeitos de secas e pragas. E destaca ainda, como mais grave, a situação de fome decretada no Sudão do Sul e a que está iminente no nordeste da Nigéria, em consequência de conflitos passados e presentes.

AS REFORMAS NECESSÁRIAS

Para o director do departamento de África do FMI, Abebe Aemro Selassie, nos países mais duramente atingidos, a consolidação orçamental é “urgentemente necessária” para estancar o declínio das reservas internacionais e contrabalançar as perdas permanentes de receitas.

O responsável afirma, no entanto, que, nos países em que o crescimento ainda é vigoroso, será importante abordar as vulnerabilidades emergentes a partir duma posição de força. “A segunda prioridade é abordar as debilidades estruturais para apoiar o reequilíbrio macroeconómico. São necessárias medidas estruturais para garantir uma posição orçamental sustentável e contribuir para um crescimento mais duradouro, através de melhorias na arrecadação de impostos, reforço da supervisão financeira e solução das debilidades de longa data no ambiente de negócios que impedem a diversificação económica”, defendeu.

Uma segunda prioridade, de acordo com Abebe Aemro Selassie, deve ser o reforço da protecção social aos mais vulneráveis, tendo referido ainda que o actual ambiente de baixo crescimento e intensificação dos desequilíbrios macroeconómicos ameaça reverter os progressos recentes na redução da pobreza.

“Os programas de protecção social existentes são, muitas vezes, fragmentados, mal direccionados e cobrem uma parcela reduzida da população”, assinalou, realçando que o mais recente relatório do FMI sobre a África Subsariana sugere que os recursos poupados com a eliminação de mecanismos generalizados e mal direccionados, como os subsídios aos combustíveis, poderiam ser empregados para amparar os grupos vulneráveis.

Os louros do passado

 

Nos últimos 15 anos, segundo ainda o BM, África atingiu “níveis impressionantes” de crescimento económico, tendo o crescimento médio do PIB mais do que duplicado, passando de uma percentagem pouco acima dos 2% nas décadas de 1980 e 1990, para mais de 5% no período entre 2001 e 2014.

Até 2015, África, no seu todo, atingiu um crescimento económico de 3%, acima de 2,5% que foi a média registada pela larga maioria das restantes regiões do mundo.

Neste mesmo ano, a África subsariana (excluindo a África do Sul) cresceu mais rapidamente do que a média continental, de 4,2%, com a África Oriental a liderar com uma taxa de 6,3%. O crescimento da África Central, do Norte de África e da África Ocidental situou-se acima de 3%, enquanto a África Setentrional cresceu a um ritmo médio de 2,2%.

China lidera investimentos

O investimento chinês em África aumentou drasticamente, tornando o país o maior contribuinte ao capital do investimento directo estrangeiro (IDE) e empregos no continente em 2016, segundo o último relatório Atractividade da África divulgado pela Ernst&Young (EY).

Desde 2005, a China investiu em 293 projectos de IDE em África com um investimento total de 66,4 mil milhões de dólares, criando 130.750 empregos, segundo o relatório.

O IDE em África aumentou progressivamente entre 2007 e 2013, refere outro relatório do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) de 2016. Em 2014, contudo, o IDE apresentou uma queda, atingindo o valor de 49.4 mil milhões de dólares, tendo, contudo, apresentado uma recuperação em 2015, ano em que chegou ao valor de 57.5 mil milhões de dólares, segundo os dados do FMI.

O BAD refere que o continente africano atraiu também investimentos de países industrializados como os Estados Unidos, a França, o Reino Unido, bem como de economias emergentes, como a África do Sul, os Emirados Árabes Unidos e a Índia. O investimento, segundo o BAD, continua a ser maioritariamente direccionado para os países ricos em recursos naturais, mas os países pobres em tais recursos estão a tornar-se mais atractivos. O sector extractivo, as infra-estruturas e as indústrias orientadas para o consumo são os sectores mais atractivos para o IDE.

Disparidades na África do Norte

No norte de África continuam a verificar-se grandes disparidades na situação macroeconómica, segundo um outro relatório sobre as perspectivas económicas de África, produzido pelo Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), o Centro de Desenvolvimento da OCDE e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), no ano passado.

Na Líbia, a ruptura da produção petrolífera, a incerteza e os actuais conflitos políticos originaram sérios problemas para a economia, em 2015, com impacto no crescimento do PIB real. Ainda assim, os analistas do FMI preveêm que o país registará um dos maiores crescimentos a nível mundial, este ano, na ordem dos 3,7%.

Na Argélia, o crescimento manteve-se estável, na ordem dos 1,7%, graças a uma recuperação da produção de petróleo. Marrocos, que este ano deverá crescer 3,3%, regista, desde 2015, o maior crescimento de base alargada na região, apoiado quer do lado da procura – pelo consumo privado e pelo investimento – quer do lado da oferta – pelo sector da construção e pela agricultura, que beneficiou de boas condições climatéricas e de investimentos anteriores na irrigação.

O turismo foi afectado pelos problemas de segurança na região, mas a uma escala muito menor do que na Tunísia. No Egipto, verificou-se um reforço do crescimento, com a estabilização do cenário político e a melhoria da confiança empresarial. O aumento dos salários e dos gastos sociais contribuiu para o consumo, tendo havido também um crescimento do investimento.

Do lado da produção, o sector dos serviços foi o motor do crescimento, embora o turismo tenha sido novamente afetado por preocupações de segurança.

Os planos de reformas económicas e de megaprojetos actualmente existentes devem contribuir, se totalmente executados, para fortalecer mais a economia.

A Tunísia registou um crescimento modesto em 2015, motivado pelas boas colheitas, mas com fraca produção noutros sectores. Os sectores mineiro e industrial foram negativamente afectados pelo fraco volume de exportações e do turismo, o qual tinha já começado a recuperar gradualmente mas voltou a cair após os ataques terroristas.